O novo sistema de pagamentos deve agilizar as entregas no comércio eletrônico. O QR Code também vai ser uma opção de pagamento no PIX; pequenos prestadores esperam pagar uma taxa menor com o pagamento instantâneo, além de fechar negócio a qualquer hora. PIX: veja exemplos de como o novo sistema de pagamentos irá funcionar na vida prática
O Jornal Nacional está apresentando esta semana uma série especial de reportagens sobre o novo sistema de pagamento instantâneo criado pelo Banco Central. Nesta terça-feira (3), a repórter Renata Ribeiro mostra como o PIX vai funcionar na prática.
Nenhum dos quatro cantos da pequena cidade de Quadra, no interior de São Paulo, passa pelo banco. Ela é uma das 2.343 cidades brasileiras sem agência bancária. Lugares onde todos os boletos levam à estrada. “Vinte quilômetros e aí vai, tipo assim, uma hora para ir, uma para voltar. Fora o tempo que você gasta lá na fila do banco”, conta a comerciante Shirley Aparecida da Silva.
A Shirley poderia pagar as contas pela internet se o pequeno comércio não rendesse dinheiro vivo. “Nós usamos aplicativo, mas às vezes não tem dinheiro na conta, daí você tem que ir depositar. Daí tem que ter esse trabalho de se dirigir até lá, Tatuí, para poder fazer o depósito, para você estar efetuando os pagamentos”, explica.
O PIX é outro mundo, onde o tempo voa e a distância não existe. Nesse mapa, com todas as contas, de todas as instituições financeiras cadastradas, o PIX é o caminho mais curto. Para entrar nesse mundo, precisa de chave, um apelido que o próprio correntista cria para os seus dados bancários. Sabe aquela lista com nome completo, nome do banco, número da agência e conta? Vai se resumir a uma linha: pode ser o CPF no caso de pessoa física, CNPJ se for empresa, e-mail, número do celular ou um código aleatório criado pelo Banco Central. É a chave PIX, que leva quem paga direto ao encontro de quem recebe.
Na vida prática, surgem novas possibilidades. Hoje, para pagar uma corrida de táxi com transferência bancária, o motorista vai ter que estacionar e esperar a compensação, que pode levar uma hora. Inviável. Com o pagamento instantâneo, o motorista passa ao passageiro a chave PIX. O passageiro entra no aplicativo do próprio banco, acessa a área do PIX, digita a chave do motorista – no caso, o CPF. O passageiro inclui o valor da corrida, manda o pagamento. Automaticamente, aparecem todos os dados da conta do motorista: nome completo, nome do banco, parte do CPF e valor. É nessa hora que o passageiro se certifica de que está mesmo mandando o dinheiro para o motorista do táxi. Se estiver errado, o passageiro clica em cancelar. Se estiver certo, confirma. Uma mensagem avisa quem paga e quem recebe que a transação foi concluída.
Em menos de dez segundos, o dinheiro deve estar no destino. Mas e agora que o passageiro ficou com a chave do motorista? Segundo o Banco Central, não tem perigo: ela só serve para mandar dinheiro para a conta corrente.
“A chave serve para endereçar o recebimento de um PIX. Então, o compartilhamento dessa informação é benéfico para as pessoas porque eu compartilho uma chave para eu receber recursos. A chave não serve para iniciar ou para acessar a minha conta. A chave não é a senha. A senha continua sendo a senha que você já usa para acessar o aplicativo da sua instituição, internet banking, biometria, reconhecimento facial – depende muito da instituição. A chave é para identificar o recebedor. Então, não precisa ter receio de compartilhar a sua chave com ninguém, a chave é feita para ser compartilhada. Ninguém vai fazer nada de posse da sua chave, pelo contrário, ela vai conseguir pagar coisas para você”, explica Breno Lobo, chefe da divisão no departamento de competição do Banco Central.
O PIX pode mudar tradições do tempo em que o dinheiro era o cruzeiro. Na pizzaria de 1958, um grupo com mais de 60 anos de amizade repete a receita de sempre. “Não é nessa pizzaria. É nessa mesa. Rachamos”, conta o aposentado Cláudio Saba.
Dividir a pizza e a conta em pedaços iguais fez história em uma noite em que esticaram a conversa.
Repórter: Esqueceu de pagar.
Cláudio: Mas assim, nem me passou. Depois, eu venho tanto que, na outra vez que eu vim, ele falou para mim: ‘você não pagou’. Eu falei: ‘está louco?’.
Entre um cartão e outro, o garçom diz que espera a vida melhorar com a chegada do pagamento instantâneo. “Às vezes a gente pega mesas com 20 pessoas, 15, e fraciona uma parcela para cada um. A taxa hoje é muito cara”, explica.
E os velhos amigos também estão cheios de expectativas. “Vão transferir tudo para mim e eu vou sair correndo. Por isso que eles me puseram no canto, para eu não ter para onde correr”, afirma Claudio.
E não tem nada mais anos 2020 do que amigas combinando a compra de máscaras à distância. “A gente conseguiu o frete grátis fazendo a compra todas juntas”, conta Priscila Reinaldo, funcionária pública.
Mas quando colocou na conta a taxa de transferência de outro banco, uma das amigas percebeu que tinha feito um mau negócio. “Ia quase sair o preço da máscara. Exatamente. Foi bem essa a questão. E ela ainda ressaltou isso: ‘Pri, só não vou fazer a transferência porque vai ficar caro demais’. Eu falei: ‘não vale a pena, depois a gente acerta’”, diz Priscila.
Depois do PIX. “Vai facilitar bastante a nossa vida, os nossos eventos, nossos encontros, as nossas saídas. Porque vai ser mais fácil, vai ser mais rápido e vai ser mais barato para gente conseguir acertar as nossas contas. Eu já fiz, inclusive, a minha chave”, conta Priscila.
O novo sistema de pagamentos deve agilizar as entregas no comércio eletrônico. “Como eu vou adquirir algo, um serviço, um produto de forma instantânea se eu não tenho um meio de pagamento instantâneo? O varejo vai conseguir disponibilizar essa forma imediata de pagamento e aí não tem que ficar esperando o dia seguinte para confirmar o pagamento para mandar o produto. Então, esse fluxo, essa agilização das coisas no serviço, é muito importante, vai mudar muita coisa”, avalia Ivan Habe, diretor-executivo de serviços financeiros da EY.
E, para o pequeno varejo, o PIX promete ser uma mão na roda. O futuro faz um ensaio na borracharia do Agnaldo. Deixando constrangida a máquina de cartão, o QR Code já é uma forma de pagamento, um código de barras que leva o dinheiro do cliente direto para a conta da empresa.
“Esperei um tempo. Eu estava meio desconfiado, não tinha muito eletrônico, essas coisas. Então foi depois que, um dia, um cliente chegou aqui, queria fazer um pagamento de R$ 40, aí falei: ‘vou testar’. Aí testei. Foi bacana. Dei o desconto para o cliente e continuei usando”, conta Agnaldo de Jesus, dono da borracharia.
O QR Code também vai ser uma opção de pagamento no PIX. Pequenos prestadores esperam arcar com uma taxa menor com o pagamento instantâneo, além de fechar negócio a qualquer hora.
“Na medida em que você tem um produto que possa funcionar 24 horas por dia, sete vezes por semana. Segmento, por exemplo, de autônomos, segmentos de pequenos estabelecimentos comerciais que fazem transações comerciais durante os finais de semana, possam ter no PIX uma possibilidade hoje de viabilizar os seus negócios e não precisar manipular dinheiro em espécie. E isso traz uma redução, não só para o setor bancário, mas principalmente para o próprio comerciante, para o próprio autônomo, que ele não precisa mais pegar aquele dinheiro, ir até o banco ou incomodar os seus clientes para dizer que precisa receber em dinheiro, em espécie. Isso aumenta as vendas, aquece a economia e traz benefício para todo mundo”, explica Leandro Vilain, diretor-executivo de Inovação da Febraban.
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