Meteorologistas alertam para onda de frio intensa que atinge a capital a partir desta quarta-feira (28), mas ressaltam que não há previsão de neve para a cidade. Geada forte ocorrida em 1918 na Avenida Paulista pode ter iniciado crença de que nevou na capital. VÍDEO: Entenda a onda de frio intenso que atinge o Brasil
A frente fria histórica que deve atingir a cidade de São Paulo a partir desta quarta-feira (28) pode trazer temperaturas negativas, especialmente para os bairros mais distantes do Centro, mas não deve provocar neve na capital.
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Relatos de uma forte geada ocorrida em 25 de junho de 1918 criaram a crença de que teria nevado na Avenida Paulista nesta data.
Movimentação de pedestres na Avenida Paulista em São Paulo (SP), no dia 19 de julho, durante outra frente fria
ROMEO CAMPOS/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
A frente fria histórica que deve atingir a cidade de São Paulo a partir desta quarta-feira (28) pode trazer temperaturas negativas, especialmente para os bairros mais distantes do centro, mas não deve provocar neve na capital.
Mas meteorologistas do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG-USP) e do Climatempo afirmam que não há nenhum registro de neve na capital desde 1910, quando começaram as medições na cidade.
Segundo a previsão do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) para esta semana, em todo o estado de São Paulo, existe um pequeno risco de neve fraca apenas na Serra da Mantiqueira nesta sexta-feira (30). O local com mais chance de registrar o fenômeno, cuja probabilidade é estimada em apenas 5%, é a Pedra da Mina, ponto mais alto do estado, localizado próximo à divisa com Minas Gerais.
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Frio intenso na região da Avenida Paulista, na zona central de São Paulo, na manhã de 30 de junho de 2021
WERTHER SANTANA/ESTADÃO CONTEÚDO
O relato de que houve neve em junho de 1918, mais de 103 anos atrás, teria sido feito pelo meteorologista José Nunes Belford Mattos, considerado um dos pioneiros da área no país, em sua caderneta de observações. Apesar de difundirem que Mattos registrou neve em seu caderno, quando ele estava na estação meteorológica que ficava na Avenida Paulista, e que teria sido encoberta por uma neblina, a informação nunca foi confirmada.
Documentos da mesma data mostram que, durante todo o dia, não houve nuvens no céu, e elas seriam necessárias para a ocorrência de neve.
“As anotações meteorológicas feitas neste dia indicam que o que ocorreu na capital em 25 de junho de 1918 foi uma sublimação de nevoeiro, juntamente com geada, e não neve em si. Para termos neve, além do frio intenso, são necessárias nuvens de chuva, e nesse dia o tempo estava firme e o céu limpo”, explica a meteorologista Daniela Freitas, da Climatempo.
Naquele 25 de junho teria sido registrada a temperatura de -3ºC, mas não está registrada como a temperatura mais baixa porque as medições oficiais começaram depois (leia mais abaixo).
A meteorologista Samantha Martins teve acesso a uma página da caderneta de observação da época. O documento indica que houve geada, mas que não havia nenhuma nuvem no céu naquele dia (veja a página abaixo).
Caderneta com dados meteorológicos do dia 25 de junho de 1918 na cidade de São Paulo
Reprodução/Meteorópole/EM-IAG-USP
O professor de meteorologia Carlos Augusto Morales Rodriguez, do IAG USP, explica que, na capital, nunca houve uma combinação de temperaturas negativas e chuvas, condições que poderiam provocar neve.
“Para nevar é necessário que as temperaturas estejam abaixo de 0°C na superfície e tenhamos nuvens estratiformes características de frente fria. Ocorre que em SP nunca foi observado temperatura abaixo de 0°C quando chove, em parte por que estamos nos trópicos, perto do mar, e as massas de ar perdem força à medida que sobem”, afirma Rodriguez.
Apesar de não haver registro de neve na região metropolitana da capital, o fenômeno já foi observado em outras partes do estado de São Paulo.
Neve na Mantiqueira
Moradores de Campos do Jordão já registraram neve na década de 1920
Arquivo Pessoal/Edmundo Rocha
Embora seja extremamente incomum, já houve neve em pelo menos duas cidades do estado de São Paulo, Campos do Jordão e Cunha, nos anos de 1920 e 1946.
No caso de Campos do Jordão, há registros fotográficos da neve em 1920. Depois desta data, a cidade já teve novos recordes de temperatura mínima, mas nunca mais com registros oficiais de neve.
“No ano de 1988, apesar do frio ter sido mais intenso e Campos do Jordão ter registrado a menor temperatura da história, não houve neve, porque não havia condição para chuva congelada”, explica a meteorologista Daniela Freitas, da Climatempo.
Nesta semana, com a chegada de uma frente fria histórica no estado de São Paulo, existe uma pequena chance de o fenômeno voltar a ocorrer na Serra da Mantiqueira.
“Nas cotas acima de 1900 m da Serra da Mantiqueira, apesar de pequena chance, não pode ser descartada possibilidade de chuva congelada e até mesmo incipientes flocos de neve”, afirma a previsão do Inmet para esta sexta-feira (30).
No entanto, para o meteorologista Franco Nadal, o local com maior probabilidade de neve na Mantiqueira não deve ser Campos do Jordão, mas a região de Pedra da Mina, nos municípios de Lavrinhas e Queluz.
“Lá na cidade de Campos do Jordão, na zona urbana, a gente não tem possibilidade de neve nesta frente fria, porque a cidade em si está a cerca de 1600m. Então não seria tanto para Campos do Jordao, seria mais para Pedra da Mina, que é o ponto culminante do estado de SP, e fica na divisa com MG”, explica Nadal, do Inmet.
Escalada da Pedra da Mina, com vista para o Pico Agulhas Negras, na região de divisa entre São Paulo e Minas Gerais
Reprodução/Arquivo Pessoal
Mesmo nesta região inóspita, a possibilidade de haver neve ainda é pequena.
“Na minha avaliação, teria cerca de 5% de chance de alguma precipitação congelada ou flocos de neve muito incipientes, ou seja, mal-formados e esparsos. Então é uma chance pequena, mas que não pode ser descartada”, completa o meteorologista.
Previsão para a semana
Embora o risco de neve seja mínimo, uma forte geada, prevista para afetar diversas regiões do estado nesta semana, pode prejudicar plantações.
A geada pode atingir, inclusive, municípios da região metropolitana da capital, a partir da quinta-feira (29).
“Há condições para geadas isolada na região metropolitana de São Paulo ao amanhecer. As temperaturas mínimas previstas na capital paulista ficam em torno dos 5°C, podendo, nas áreas menos urbanizadas, especialmente do Sul da cidade, atingir os 3°C. Já a máxima não deve passar dos 12°C na capital paulista”, afirma a previsão do Inmet.
Na madrugada de sexta-feira (30), a possibilidade de geada é ainda maior, e vale para todo o estado, exceto o litoral.
Pedestres enfrentam frio intenso na região do Viaduto Santa Generosa, na zona sul de São Paulo, na manhã do dia 30 de junho de 2021
BRUNO ROCHA/ENQUADRAR/ESTADÃO CONTEÚDO
A mínima prevista para a capital é de 3°C, valor quer, se confirmado, pode representar a menor temperatura dos últimos 27 anos.
Os termômetros devem registrar ainda menos nas áreas mais distantes do centro da cidade, que tradicionalmente têm temperaturas mais baixas, e que podem chegar a índices abaixo de zero.
“Durante a madrugada de sexta-feira, a expectativa é de uma das menores temperaturas dos últimos anos na capital São Paulo, com geadas e projeção de mínima de cerca de 3°C no centro expandido. Os termômetros podem ficar em torno de zero a um grau negativo nas áreas de menor urbanização do sul do município”, afirma o boletim do Inmet.
“Deverá ser a madrugada mais fria do ano e se a temperatura baixar de 3,5°C no Mirante de Santana [que é a menor temperatura registrada em 2016], a capital paulista registará a menor temperatura nos últimos 27 anos, já que em 1994 a menor temperatura foi de 0,8°C (em 10/07/1994)”, afirma o alerta emitido pelo Inmet.
Recordes de frio em SP
Pessoas se protegem do frio na zona sul da cidade de São Paulo, na manhã desta terça-feira (20). O dia começou gelado em São Paulo, cidade que registrou a menor temperatura do ano.
Bruno Rocha/Enquadrar/Estadão Conteúdo
Os registros oficiais do Inmet em São Paulo são feitos na estação meteorológica do Mirante de Santana, na Zona Norte da capital, que opera desde 1943.
Desde esta data, o recorde absoluto de temperatura mínima em São Paulo ocorreu em 2 de agosto 1955, com -2,1°C.
Veja as 10 menores temperaturas já registradas no Mirante de Santana, em SP:
-2,1°C em 02/08/1955
0,8 °C em 09/08/1948
0,8 °C em 10/07/1994
1,2 °C em 01/06/1979
1,2 °C em 26/06/1994
1,5 °C em 18/07/1975
1,7°C em 11/07/1953
1,9 °C em 12/07/1965
2,0°C em 27/06/1994
2,0°C em 09/07/1994
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