De janeiro a dezembro de 2019, foram registrados 89 mil focos de calor na Amazônia, 30% a mais do que no ano anterior. Área da Amazônia é vista em chamas ao ser derrubada por madeireiros e fazendeiros perto de Humaitá (AM) em agosto
Ueslei Marcelino/Reuters
Dados divulgados pelo projeto Cortina de Fumaça, lançado na quarta-feira (23), mostram que propriedades de médio e grande porte são responsáveis por 72% dos focos de calor nas quatro maiores áreas críticas da Amazônia em 2019.
O levantamento, produzido pela Ambiental Media em parceria com o Pulitzer Center, cruzou dados oficiais de desmatamento e queimadas, monitorados pelo Inpe, com as declarações dos proprietários rurais sobrea área de seus imóveis no Cadastro Ambiental Rural (CAR).
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Os focos de calor são qualquer temperatura acima de 47°C registrada pelos satélites de monitoramento e não necessariamente são um foco de fogo ou incêndio.
De janeiro a dezembro de 2019, foram registrados 89 mil focos de calor na Amazônia, 30% a mais do que no ano anterior, de acordo com o Inpe. Já entre os meses de maio e julho de 2020, houve um aumento de 23% nos focos em comparação ao mesmo período no ano passado. Além disso, junho apresentou os maiores índices para o mês em 13 anos.
Vista aérea de área queimada na Amazônia, perto de Apuí (AM) em agosto
Ueslei Marcelino/Reuters
Também chamadas de ‘hotspots’, as áreas críticas englobam quatro municípios líderes em fogo e desmatamento em 2019: Altamira e São Félix do Xingu, no Pará; Porto Velho, em Rondônia; e Lábrea, no Amazonas.
A bióloga brasileira Erika Berenguer, pesquisadora nas Universidades de Oxford e Lancaster, explica que ambos os fenômenos – desmatamento e queimadas – não aconteceram de maneira dissociada na Amazônia nos últimos dois anos.
“No processo do desmatamento, o fogo é a etapa final, transformando em cinzas a floresta que ali estava, já que não tem como colocar boi ou plantar grão com todas aquelas árvores caídas no chão”, explica.
Considerando toda a Amazônia Legal no primeiro semestre deste ano, 60% dos focos aconteceram em propriedades rurais, sendo 50% em fazendas de médio e grande porte e 10% em pequenas propriedades. As terras indígenas correspondem a 12% dos focos de calor.
Os dados são da nota técnica do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), divulgada em agosto deste ano, e vão de encontro ao discurso de Bolsonaro na ONU na terça-feira (22), quando ele disse que “índios e caboclos” são os responsáveis pelas queimadas na Amazônia.
Para Paulo Moutinho, cientista sênior do Ipam, é fundamental que o governo siga as orientações da ciência. “Há previsões muito importantes sendo feitas em relação ao desmatamento e fogo na região que precisam ser consideradas pelo governo, caso contrário nós continuaremos a assistir esses eventos de desmatamento e fogo nos próximos anos durante o período seco na região.”
A nota do Ipam destaca ainda que o fogo de manejo agropecuário é o tipo mais comum na Amazônia desde 2016, mas os focos de calor registrados realizado em áreas recém-desmatadas e os incêndios florestais cresceram, confirmando a relação das queimadas ao desmatamento.
O Imazon, instituto que faz pesquisas na Amazônia há 30 anos, aponta dois motivos que colaboram para o desmatamento ilegal. “O estímulo que está vindo do mercado e o enfraquecimento do lado da política na aplicação da penalidade, da fiscalização e da prevenção”, cita Paulo Barreto, pesquisador do instituto.
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