Cenas foram registradas pela bióloga Andréa Soares Pires e pelo engenheiro florestal Helder Henrique de Faria, em Teodoro Sampaio (SP), e chamaram a atenção porque a espécie do maior felino do continente americano possui hábitos noturnos. Pesquisadores flagram onça-pintada no Parque Estadual do Morro do Diabo
Dois pesquisadores científicos que trabalham no Instituto de Pesquisas Ambientais (IPA), em conjunto com a Fundação Florestal (FF), flagraram duas onças-pintadas predando macacos-pregos em plena luz do dia no Parque Estadual do Morro do Diabo, em Teodoro Sampaio (SP).
As cenas foram registradas pelo engenheiro florestal Helder Henrique de Faria, em fotos, e pela bióloga Andréa Soares Pires, em vídeo, na manhã da terça-feira (17), e chamaram a atenção porque a espécie de felinos que está ameaçada de extinção possui hábitos de fim de tarde e noturnos (veja o vídeo acima).
Em conversa com o G1, Andréa não escondeu a emoção de presenciar esse momento marcante para o ecossistema em um dos últimos remanescentes de Mata Atlântica de Interior.
“Cheguei a chorar de emoção. Esses animais são a resistência. É super importante esse registro”, contou a bióloga.
Em postagem em uma rede social, ela disse que o flagrante das onças-pintadas foi a terceira maior emoção que já sentiu em sua vida – as duas primeiras foram dois partos naturais.
Os pesquisadores haviam se deslocado em um carro para checar as condições de funcionamento de uma das câmeras de vídeo que integram um projeto de monitoramento existente no parque estadual quando se depararam com as onças, por volta das 10h.
Pesquisadores flagraram onça-pintada no Parque Estadual do Morro do Diabo
Helder Henrique de Faria
“Estava tudo certo com a câmera de monitoramento e eu parei para fotografar um lindo ipê-roxo florido que despontava no cenário. Neste momento, a primeira onça passou a 30 metros de distância de mim e deixou no local um macaco-prego já abatido. Nós continuamos no local e vimos a segunda onça, a uma distância de 80 a 100 metros, também com outro macaco-prego. Aí eu consegui fazer o vídeo dessa segunda onça”, detalhou Andréa ao G1.
“Vamos investigar isso com os pesquisadores, pois o macaco-prego [Sapajus nigritus] não é uma presa usual da onça-pintada para a predação. A questão do horário, no período da manhã, também é muito peculiar e chama muito a atenção, já que a onça tem hábito crepuscular. As duas onças estavam caçando juntas e predando macacos-pregos”, salientou a bióloga.
“A onça-pintada tem hábito crepuscular, ou seja, de final da tarde e da noite, mas neste caso acredito que elas tenham aproveitado a oportunidade e a facilidade de alimento. Isso vamos tentar entender com os resultados do monitoramento, como elas estão ‘usando’ o parque e como estão circulando pela área”, afirmou.
Pesquisadores flagraram onça-pintada no Parque Estadual do Morro do Diabo
Helder Henrique de Faria
Segundo a pesquisadora, a dieta da espécie do maior felino do continente americano é descrita como oportunista, o que a faz consumir as presas de acordo com a disponibilidade, a abundância e a vulnerabilidade no ambiente.
Assim que perceberam a presença dos pesquisadores, as onças abandonaram o local e voltaram a se refugiar dentro da mata que forma o parque estadual – uma delas deixou para trás a presa abatida.
“A primeira [onça] ficou bem próxima, batendo as patas no chão, o que chamamos de comportamento agonístico. Se a gente não saísse logo, ela viria ‘disputar’ a presa conosco. Então, fizemos a foto do macaco-prego abatido e saímos. E a outra [onça], do vídeo, levou a presa para dentro da mata”, relatou Andréa ao G1.
Pesquisadora parou para fotografar ipê-roxo florido e foi surpreendida pela presença de onças-pintadas no Parque Estadual do Morro do Diabo, em Teodoro Sampaio
Andréa Soares Pires
Câmeras de monitoramento
A bióloga Andréa Soares Pires é a coordenadora geral de um projeto-piloto de monitoramento da biodiversidade por câmeras que começou em junho deste ano a captar imagens em vídeo em quatro núcleos divididos entre três unidades de conservação ambiental do Estado de São Paulo.
São elas:
a Estação Ecológica Juréia-Itatins, em Peruíbe (SP);
o Parque Estadual do Morro do Diabo, em Teodoro Sampaio; e
o Parque Estadual da Serra do Mar, onde existem dois núcleos: Itariru, em Pedro de Toledo (SP), e Curucutu, em São Paulo (SP).
Segundo a pesquisadora, o investimento nestes quatro núcleos que integram o projeto-piloto é de aproximadamente R$ 400 mil em recursos da Câmara de Compensação Ambiental da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado de São Paulo.
Pesquisadores flagraram onça-pintada no Parque Estadual do Morro do Diabo
Helder Henrique de Faria
Andréa explicou ao G1 que já estão em operação 80 câmeras, 20 equipamentos em cada núcleo, que captam imagens ininterruptamente, 24h por dia.
“Os equipamentos ficarão operando e a cada 60 dias, então, iremos capturar os cartões de memória e trocaremos as câmeras de lugar, colocando-as em outras 20 áreas nos mesmos núcleos. Ao longo de um período de 12 meses, haverá um ciclo a cada 60 dias de troca dos pontos de captação de imagens nestes quatro núcleos que fazem parte do projeto-piloto”, salientou a pesquisadora.
A bióloga adiantou ao G1 que já foi licitada a compra de mais 268 câmeras que deverão ser instaladas em outras unidades de conservação do Estado de São Paulo a partir do mês que vem.
Segundo Andréa, a iniciativa é da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente e da Fundação Florestal, que é a gestora das áreas.
As espécies-alvo do projeto-piloto são de quatro mamíferos terrestres de médio e grande portes:
anta (Tapirus terrestris);
onça-parda (Puma concolor);
queixada (Tayassu pecari); e
onça-pintada (Panthera onca).
No entanto, Andréa pontuou que a captação de imagens deverá indicar informações que irão muito além de tais espécies que são consideradas “guarda-chuvas”, ou seja, quando a sua preservação permite a conservação de toda uma cadeia alimentar.
“O projeto irá gerar muita informação preciosa. Serão informações para a preservação dessas espécies. Teremos condições de fazer uma análise de ocupação e do que acontece em cada área, passando a saber como é a movimentação dos bichos. Vai ser registrado o que acontece e isso inclui, certamente, outras espécies”, enfatizou a pesquisadora ao G1.
“Nosso time é formado por pesquisadores, analistas ambientais e gestores da Fundação Florestal”, contou Andréa.
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Os principais motivos que nortearam a escolha das espécies-alvo do monitoramento foram o grau de ameaça, a fragilidade, a baixa resiliência e a necessidade de habitats em alto grau de preservação e extensos; a suscetibilidade a pressões de caça, ou seja, por se tratarem de espécies cinegéticas; por serem espécies dispersoras de sementes (salvo os carnívoros), auxiliando na manutenção das florestas; e, por último, por se tratarem dos maiores mamíferos terrestres da Mata Atlântica.
Andréa frisou que o monitoramento é um instrumento amplamente utilizado para determinar padrões ecológicos que norteiam e subsidiam ações de proteção e preservação dos ecossistemas. Essa temática, envolvendo o monitoramento de mamíferos terrestres de médio e grande portes, foi indicada como uma das linhas prioritárias de ação da Fundação Florestal, com vistas à melhoria na eficácia na gestão de unidades de conservação, segundo a pesquisadora. Ela ainda contou que o projeto tem como objetivo a implementação de um piloto para o desenvolvimento de um Programa de Monitoramento da Biodiversidade nas Unidades de Conservação do Estado de São Paulo.
Ainda está em fase final de desenvolvimento um aplicativo que permitirá aos usuários a postagem de fotos e vídeos das unidades de conservação, o que, segundo Andréa, também irá contribuir para o projeto de monitoramento.
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