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Economia

Dólar volta a supermercados em Cuba para impulsionar economia

Nesta segunda-feira, país eliminou o imposto de 10% sobre o dólar que mantinha desde 2004. Cubanos fazem fila para comprar produtos em loja que vende em dólares
Alexandre Meneghini/Reuters
Abrir uma conta no banco. Esperar duas semanas pelo cartão. Conseguir dólares, depositá-los na conta e, finalmente, ir ao supermercado para comprar comida com o cartão. Cuba dolariza parcialmente sua economia para ter divisas e fortalecer seu sistema financeiro.
“Não é uma moeda à qual temos acesso com facilidade, mas não a vejo mal”, diz Yordanka Cainé, uma dona de casa na casa dos 40 anos que amanheceu na porta de um supermercado no bairro de Miramar.
Nesta segunda-feira, Cuba eliminou o imposto de 10% sobre o dólar que mantinha desde 2004 e expandiu seu uso para a venda de alguns alimentos e produtos de higiene pessoal em 72 lojas em todo o país, onde não se aceita mais o pagamento em papel moeda.
Acostumados a comprar em dinheiro ou nas duas moedas que circulam no país – o CUC (equivalente ao dólar) e o CUP (24 CUP equivalem a 1 dólar) -, agora os cubanos precisam se acostumar a uma nova opção, que não elimina as tradicionais.
Com o novo coronavírus sob controle, Cuba busca captar moeda estrangeira para enfrentar a crise gerada pela pandemia, que deixou a ilha sem a receita do turismo, o que se soma ao endurecimento do bloqueio de Washington, que dificulta as operações comerciais.
“Fui ao banco, tirei o cartão, esperei 15 dias para que fosse entregue a mim. Depois de depositar o dinheiro em dólares”, conta Yordanka. “Vim para comprar xampu, pasta de dente, sabão, e é disso que preciso”, explicou.
Cuba espera aproveitar as divisas captadas para manter a oferta em um país que importa quase todos os alimentos que consome.
“Cuba não exporta, tem que importar muito, pagar dívidas e não tem divisas. No menu de opções está dolarizar a economia, apesar de dizerem que não é como em 93, quando o dólar estava na rua. Porque para comprar com o cartão eu tenho que depositar dólares”, disse o economista cubano Omar Everleny Pérez.
A ilha já tinha problemas de suprimento antes da pandemia. A falta de acesso ao crédito ou o atraso no pagamento de algumas de suas dívidas forçam o país a comprar à vista e a precisar de uma moeda forte.
“Apartheid econômico”?
Desde 2004, a taxa de câmbio do dólar recebia uma penalidade, justificada pelo governo na dificuldade de operar nessa moeda devido a sanções.
Com os atrasos nas reformas de sua economia socialista e o aperto do bloqueio, Cuba teve que superar a falta de liquidez e, em 2019, iniciou as vendas de eletrodomésticos e carros em dólares, também por meio de cartões bancários.
Apesar da alta demanda, os consumidores precisavam depositar os dólares no banco, mas com uma penalização de 10%, que foi eliminada.
Mas como conseguir dólar na ilha?
“A família envia remessas ou você compra a moeda (o dólar) de alguém que vem (em uma viagem), mas dá um pouco de trabalho para colocar a moeda no cartão”, explica Dany, 30 anos, trabalhador autônomo.
Embora os mercados em moedas nacionais continuem operando, as pessoas estão preocupadas se eles estariam abastecidos quanto os que vendem em dólares. Não se trata de um “apartheid econômico”, disse o ministro da Economia Alejandro Gil, mas de satisfazer a demanda existente em um setor da população com maior poder de compra.
Na ilha de 11,2 milhões de habitantes, o salário médio é de US$ 50.
Dólar em alta
No mercado Zona , no bairro de Miramar, as caixas de cervejas e refrigerantes eram vendidas no atacado e carregadas imediatamente nos veículos dos clientes. Alguns Lada russos dos anos 80 quase saíram se arrastando pelo peso que carregavam.
A taxa de câmbio oficial em Cuba é de 0,97 CUC por dólar. Mas a demanda por dólares para depositá-los nas contas disparou e no mercado informal foi de cerca de 1,20 CUC.
“Espero que essa (a medida para aumentar dividendos) seja mais uma opção e traga benefícios a outras pessoas”, diz Rafael, um físico de 38 anos que veio comprar queijo.
“Aqui havia grão de bico, feijão, macarrão de vários tipos, geleias, picadilho, carne, filé, chouriço, queijo”, diz Hilda, uma dona de casa que mostra sua nota fiscal ao sair do mercado de La Puntilla: mais 160 dólares.
Por sua vez, Dany explica que os preços acabam ficando mais caros porque se precisa pagar mais pelo dólar que é depositado nas contas. “Enquanto os produtos estiverem lá, você se sacrifica. E você os compra porque, se não, não come”, diz.

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