Expectativa majoritária no mercado era de redução de 0,5 ponto percentual na taxa básica de juros. Analistas dizem que Selic pode chegar a 2,25% ao ano. A redução de 0,75 ponto percentual na taxa básica de juros promovida pelo Comitê de Política Monetária (Copom) nesta quarta-feira (6) foi considerada agressiva e surpreendeu os analistas consultados pelo G1. A expectativa majoritária era de que o corte seria de 0,5 ponto.
Com a nova redução, a taxa de juros chegou a 3% ao ano e foi ao menor patamar desde 1999, quando entrou em vigor o regime de metas para a inflação.
A leitura é de que Copom deixou a porta aberta para um novo corte na próxima reunião de política monetária, em junho, e que os sinais de fraqueza da economia provocados pela pandemia de coronavírus pesaram na decisão de promover um ajuste na Selic maior do que o esperado.
Selic cai de 3,75% para 3% ao ano e dólar chega a R$ 5,70
“Ainda estamos digerindo o comunicado do Copom. Estávamos trabalhando com um corte de 0,50 ponto”, afirmou o superintendente de pesquisas macroeconômicas do banco Santander, Mauricio Oreng, destacando que os membros do BC “aceleraram o passo do corte de juros”.
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Reprodução/JN
Sinais de fraqueza da economia
Nos últimos dias, os indicadores mostraram que os efeitos do coronavírus na economia brasileira têm sido intensos. Em março, a produção industrial despencou 9,1% na comparação com fevereiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foi o pior desempenho para o mês desde 2002, quando teve início a série histórica.
“O BC está com medo dos efeitos da pandemia se aprofundarem sobre a atividade econômica e, consequentemente, prejudicarem o cumprimento das metas de inflação”, afirma Alessandra Ribeiro, economista da consultoria Tendências. Para ela, o Copom indicou que pode fazer mais um corte de até 0,75 ponto na próxima reunião e que deixou “a porta aberta” para mais reduções após junho.
No comunicado desta quarta, o próprio BC reconheceu a piora da atividade econômica e citou que indicadores de abril “mostram que a contração da atividade econômica será significativamente superior à prevista na última reunião do Copom”. Por ora, com toda essa fraqueza, os analistas já estimam que o PIB deve recuar perto de 4% em 2020.
“Os dados da produção industrial foram bem importante no sentido de demonstrar ao Comitê o tipo de cenário que se espera para o PIB neste ano”, diz Oreng.
Incerteza fiscal limita mais corte
A dificuldade de promover um corte mais profundo da Selic nos próximos encontros do Copom se dá pela incerteza com cenário fiscal do país. Para uma economia em desenvolvimento, o Brasil já é considerado um país bastante endividado e que agora lida com a pressão de ter de aumentar os gastos públicos para dar conta de ajudar empresas e famílias a superarem a crise provocada pelo coronavírus.
No comunicado desta quarta, o Copom aponta que a políticas fiscais de resposta à pandemia podem piorar a trajetória fiscal do país e que há um risco de frustração com a agenda de reformas, o que pode, segundo o Comitê, “elevar os prêmios de risco e gerar uma trajetória para a inflação acima do projetado no horizonte relevante para a política monetária”.
“Apesar da forte contração do PIB e das expectativas estarem ancoradas, o Copom coloca a política fiscal como um fator negativo no seu balanço de riscos para inflação”, afirma a economista-chefe da Claritas Investimentos, Marcela Rocha. Ela projeta mais um corte de 0,75 ponto em junho.
Na semana passada, a Secretaria do Tesouro Nacional estimou o rombo nas contas do setor público consolidado (governo, estados, municípios e empresas estatais) deverá se aproximar de R$ 600 bilhões neste ano, o equivalente a cerca de 8% do Produto Interno Bruto (PIB). Se confirmado, esse será o maior valor da série histórica do BC, iniciada em 2001.
“Notícias ruins em relação ao fiscal, como contratação permanente de despesas, vão acabar limitando espaço para o BC reduzir os juros”, afirma Alessandra, da Tendências. “Sem contratar despesas permanentes, nós já vamos sair [da pandemia] com uma dívida pública encostando em 90%. É verdade que o mundo inteiro vai sair endividado. Mas será que vamos conseguir sair dessa dívida e fazer reformas fiscais se continuarmos em turbulência política?”, diz.
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