Proposta também autoriza bloqueio de R$ 9 bilhões em gastos não obrigatórios para compensar despesas obrigatórias que tinham sido subestimadas no orçamento deste ano. O Congresso Nacional aprovou nesta segunda-feira (19) um projeto de lei que autoriza o governo a abrir crédito para custear medidas de enfrentamento à pandemia sem indicar de onde virá o dinheiro para cobrir esses gastos.
Além de dispensar o governo de indicar uma compensação a esses gastos adicionais, o projeto de lei exclui os programas emergenciais de auxílio a empresários da meta fiscal estabelecida para 2021 – um rombo de R$ 247,1 bilhões nas contas públicas.
Além disso, o projeto autoriza o governo a bloquear gastos discricionários (facultativos) para recompor despesas obrigatórias, como benefícios previdenciários, já previstas no texto da Lei Orçamentária de 2021.
O texto altera a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para liberar a abertura dos créditos extraordinários. A mudança é vista pela equipe econômica como necessária para a retomada dos programas de crédito a micro e pequenas empresas (Pronampe) e de redução de salário e jornada (BEm), adotados em 2020.
Em nota à imprensa publicada nesta segunda, o Ministério da Economia informa que, com a aprovação do projeto de lei, destinará “nos próximos dias” até R$ 10 bilhões para o BEm e até R$ 5 bilhões para o Pronampe.
As sessões do Congresso costumam ser feitas de modo conjunto, com a presença de deputados e senadores em plenário. No entanto, em razão da pandemia do coronavírus, as sessões têm sido realizadas separadamente. Tanto deputados quanto senadores aprovaram a medida nesta segunda.
Impasse no Orçamento 2021
Na aprovação do Orçamento de 2021, o relator, senador Márcio Bittar (MDB-AC), cortou cerca de R$ 26 bilhões em despesas obrigatórias – como as destinadas ao pagamento de aposentadorias, por exemplo – e irrigou as chamadas emendas parlamentares, instrumento por meio do qual deputados e senadores destinam verbas às bases eleitorais.
O texto aprovado foi considerado “fictício”, já que exigia adequações orçamentárias para fazer cumprir despesas obrigatórias, que não podem ser contingenciadas.
Entenda a polêmica em torno do Orçamento 2021
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O relator desse novo projeto de lei no Congresso, deputado Efraim Filho (DEM-PB), estima que a aprovação pode autorizar o bloqueio de até R$ 9 bilhões em despesas não obrigatórias para recompor os gastos obrigatórios do governo.
“No PLN, nós vamos conseguir fazer o bloqueio dessas despesas discricionárias para conseguir compor essas despesas obrigatórias e assim dar como resultado, também, o espaço na meta fiscal para a reedição das medidas protetivas ao empreendedor e ao emprego”, disse.
Sanção do Orçamento
Na avaliação de técnicos do Congresso, a aprovação deste projeto de lei é um “preparativo” para a sanção do Orçamento, que precisa acontecer até a próxima quinta-feira (22).
Além disso, é uma forma de o governo se precaver em relação a questionamentos feitos pelo Tribunal de Contas da União (TCU) quanto às estimativas de despesas.
Se o Orçamento for sancionado como está, sem previsão para todas despesas obrigatórias, o presidente da República teme ser enquadrado por crime de responsabilidade fiscal. O veto às emendas parlamentares, por outro lado, desgastaria Bolsonaro com o Congresso.
O Executivo não precisa de autorização legislativa para contingenciar despesas não obrigatórias – chamadas de “discricionárias”, que incluem parte das emendas parlamentares e os investimentos federais.
O projeto de lei seria, portanto, uma sinalização aos órgãos de fiscalização de que parte dos cortes feitos irregularmente por Bittar serão reacomodados no Orçamento 2021.
Governo e Congresso fecham acordo para pôr fim ao impasse do orçamento
Nesse sentido, mais cedo nesta segunda, a ministra da Secretaria de Governo, Flávia Arruda, afirmou que devem ser cortados cerca de R$ 10,5 bilhões nas emendas de relator. Segundo ela, o governo “caminha” para um veto parcial na proposta do Orçamento 2021 aprovada pelo Congresso.
De acordo com a ministra, o governo também tenta fazer cortes em despesas obrigatórias (como salários e transferências) e outros gastos discricionários, para além das emendas (como despesas de custeio e investimentos).
Como o projeto aprovado pela Câmara também autoriza que o governo federal direcione recursos para a saúde fora da meta fiscal, uma opção de acordo em estudo é cortar emendas parlamentares ligadas à saúde e convertê-las em ações federais fora da meta fiscal.
Por isso, nos bastidores, deputados dizem que o projeto aprovado nesta segunda é uma forma de “dar conforto” a Bolsonaro para sancionar o Orçamento.
Risco de ‘shutdown’ da máquina pública
Outra mudança no projeto retira a exigência de atender as despesas de funcionamento dos órgãos (exceto pelas estatais) antes das prioridades e metas da administração pública federal para 2021.
Técnicos avaliam que a mudança dá mais segurança ao governo para bloquear um nível maior de despesas discricionárias a fim de preservar emendas parlamentares e evitar conflitos com o Congresso.
Porém, a medida eleva o risco de “shutdown” da máquina pública se o governo decidir cortar um volume muito grande de despesas discricionárias de funcionamento, que já estão em nível historicamente baixo.
Neste caso, por exemplo, pode haver impactos nos serviços públicos – como na emissão de passaportes por parte da Polícia Federal ou no processamento de benefícios pelo INSS.
Fora da meta fiscal
O projeto também prevê que, em 2021, algumas medidas de combate à pandemia não sejam contabilizadas na meta fiscal do ano, estabelecida em déficit de R$ 247,1 bilhões. São elas:
ações e serviços públicos de saúde identificados como programação de enfrentamento à pandemia;
Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe);
Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (BEm).
Segundo técnicos do Congresso, a mudança permite que o governo federal crie gastos relacionados à pandemia sem que os valores precisem entrar no cálculo da meta fiscal.
Como se trata de despesas que não estavam previstas na elaboração do Orçamento de 2021, os técnicos avaliam que a medida atende os requisitos para a abertura de créditos extraordinários – isto é, que sejam relevantes, urgentes e imprevisíveis.
Esse flexibilidade, porém, seria uma forma de garantir que não haverá questionamento futuro sobre a previsibilidade ou não dessas despesas, ponderam.
O ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), criticou a medida e questionou se não seria uma espécie de “orçamento criativo”.
“Essa emenda coloca fora do teto o Programa do Bem e o Pronampe, de aproximadamente 16 bilhões, para poder sancionar a emenda de relator de 16 bilhões. É ou não é um orçamento criativo?”, escreveu em uma rede social.
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