Dados do Instituto Pet Brasil obtidos com exclusividade pelo G1 apontam que vendas pelo comércio eletrônico do setor cresceram 65,6% no primeiro trimestre de 2020 em comparação com o mesmo período do ano passado. Cuidados veterinários também tiveram alta. A beagle Bruma, logo depois de tomar banho em casa, e Pipoca, deitado no colo de uma de suas donas durante o home office: mudança de rotina das famílias com animais de estimação movimentou o mercado pet no início de 2020
Arquivo pessoal
A beagle Bruma, de 10 anos, estava acostumada a tomar banho a cada 15 dias em um pet shop. Há alguns meses, porém, a sua rotina mudou: os banhos passaram a ser dados em casa pela sua dona, Beatriz Rivaldo, de 20 anos, que teve que comprar todos os produtos e adaptar os cuidados para dentro de casa.
Já para Pipoca, de 5 anos, a mudança foi ainda mais radical. Depois de uma vida de abandonos, ele foi adotado pelas jornalistas Tarla Prado, de 25 anos, e Sabrina Trizote, de 26 anos, em 15 de março. Um dia depois, as suas donas começaram a fazer home office, o que significou mais atenção e companhia para Pipoca — que passou a ganhar petiscos, acessórios e ração, tudo devidamente comprado pela internet.
As duas “famílias” de pets e suas tutoras moram em São Paulo, cidade que foi o ponto inicial da pandemia do coronavírus no Brasil e que passou a adotar medidas de isolamento social e fechamento do comércio a partir de março.
Mesmo que veterinários e pet shops tenham continuado a funcionar, já que são considerados serviços essenciais, o mercado pet como um todo sentiu os efeitos da mudança de comportamento das pessoas na aquisição de produtos e de serviços prestados.
E, no geral, os impactos foram positivos: com exceção da venda de animais diretamente dos criadores e dos serviços gerais, como banho e tosa, todos os outros segmentos do setor registraram crescimento no faturamento nos primeiros três meses deste ano em comparação com o mesmo período de 2019. Com isso, a expectativa é que 2020 feche com um crescimento de 6%.
Os dados, que foram reunidos pelo Instituto Pet Brasil e são divulgados exclusivamente pelo G1, apontam que a maior alta foi no setor de comércio eletrônico, cujo faturamento cresceu 65,6% no período. O valor movimentado saltou de cerca de R$ 1,5 bilhão para R$ 2,5 bilhões.
Em segundo lugar, estão os produtos veterinários, como medicamentos, com alta de 18%. O segmento de alimentos, chamado de “pet food”, é o terceiro colocado, com 10% de crescimento. O ranking ainda enumera a alta de 6,9% de “pet care”, que são os produtos para cuidar do animal, como xampus, e de 5% de serviços veterinários.
Maioria dos segmentos do mercado pet teve alta no faturamento no primeiro trimestre de 2020
Rodrigo Sanches/Arte
Nelo Marraccini, presidente-executivo do instituto, afirma que o mercado pet já vem crescendo há alguns anos no país, com o aumento de lojas e de animais de estimação, mas que os números do primeiro trimestre deste ano refletem o começo da quarentena no Brasil.
“A pandemia foi um choque geral para todo mundo. As pessoas ficaram sem saber o que fazer, como o futuro ia ser, o dia a dia”, afirma. Segundo ele, essa reação levou à queda de banhos e tosas nos pet shops, mas gerou o aumento das vendas online de rações, acessórios e outros produtos.
Marize Fonseca, supervisora de operações de uma unidade do pet shop Petland em Moema, na Zona Sul de São Paulo, viu na prática esse aumento.
“No início da quarentena, com o desespero das pessoas diante da instabilidade do momento, muita gente comprou ração para estocar. Também teve um crescimento muito grande de vendas de areia para gato e de petiscos”, afirma Marize Fonseca.
Esse movimento inicial, muito semelhante à correria que também aconteceu aos supermercados logo após os anúncios das medidas de isolamento social e de home office, resultou em um crescimento de 30% no faturamento das unidades da Petland em uma das últimas semanas de março, segundo o CEO Rodrigo Albuquerque. A rede tem 100 lojas em 17 estados do país.
Além disso, assim como o resto do setor, a empresa teve que se adaptar à nova realidade do país. “A gente criou novos formatos, como o delivery dos produtos e o ‘drive thru’, que foi implementado em mais de 70% da rede”, afirma.
Marize Fonseca, supervisora de operações de uma unidade da Petland em São Paulo, diz que as vendas de rações e acessórios cresceu com a quarentena
Arquivo pessoal
Albuquerque diz ainda que a quarentena teve um efeito catalisador na implantação do e-commerce nas unidades da Petland. “A plataforma de e-commerce foi adquirida no ano passado. Antes da pandemia, cinco lojas estavam operando através da plataforma. Com a pandemia, isso já foi para 40% da rede. As pessoas viram a necessidade de estar plugada e de fazer vendas online”, diz.
Para diminuir os impactos da mudança de comportamento e garantir a fidelização do cliente, Marize afirma que focou em fornecer um atendimento “diferenciado” às pessoas, mesmo que à distância.
“Cada produto que é entregue pelo e-commerce ou pelo drive trhu, a gente fez uma cartinha falando desse momento de crise, dizendo que estamos juntos, e damos um brinde junto, como um ossinho ou um brinquedinho. É uma forma de agradecer”, diz.
Ela também destaca que um dos sucessos de venda foi um pacote de banho com 50% de desconto. “O pacote tem a validade para até o final de dezembro, então o cliente não precisa necessariamente sair de casa e ir ao pet shop agora para dar banho no seu animal”, diz.
Com as medidas de isolamento social, Beatriz começou a dar banho em casa na beagle Bruma. Antes, a cachorrinha tomava banho em pet shop a cada 15 dias
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Maior convivência e cuidados
Além das vendas online de produtos como ração e acessórios, os bichinhos também passaram a receber uma atenção “extra” dos donos com a quarentena, o que resultou no aumento de cuidados veterinários.
“No dia a dia, na correria, o pet fica sozinho em casa ou com ‘dog walk’. Mas, agora, ficando em casa, as pessoas percebem mais o seu animal. Aumentam a interação e a convivência. Aí percebem se está mancando, se tem um problema em uma patinha, coisas que os donos não percebiam antes. As pessoas estão mais ligadas ainda ao seus pets”, diz Marraccini.
Marize também destaca que a nova rotina resultou em um aumento da venda de brinquedos para os animais. Segundo ela, cada tutor está comprando, em média, de dois a três brinquedos a mais.
“Com o pet sem poder sair de casa pra passear tanto quanto antes, ele começa a ficar mais estressado. Pra diminuir o estresse, muitos estão usando brinquedos. Aí tem de todas as formas: pelúcia, emborrachado, mas são vendidos principalmente os que interagem com eles. Aí o pet gasta mais energia”, diz Marize.
Tarla e Sabrina adotaram o Pipoca um dia antes de as duas começarem a fazer home office
Arquivo pessoal
E, de um modo geral, tanto Tarla e Sabrina quanto Beatriz concordam que essa maior convivência está sendo positiva para elas e seus cachorros.
“A gente tem mais tempo para ficar junto com ela”, diz Beatriz sobre Bruma. “Ela parece bem mais tranquila. Sempre fica junto, perto do computador. Antes, ela era bem chorona, fazendo drama. Agora, ela parece estar em paz.”
Tarla e Sabrina ainda afirmam que a adoção veio na hora certa, já que, na nova rotina de sair o mínimo possível de casa, os pets e os donos se fazem companhia e se distraem.
“Estamos em uma época muito difícil, emocionalmente falando. Lemos muitas notícias tristes todos os dias, estamos sem ver nossos pais e amigos há mais de dois meses e, às vezes, tudo se torna complicado”, comenta Tarla.
“A presença do Pipoca consegue nos alegrar. Nos dá motivo para brincadeiras e para banhos de sol de 15 minutinhos por dia, e faz com que a gente se divirta muito mais.”
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