Matéria-prima usada por designer sai do Acre e Pará. Flavia trabalha também capacitando as comunidades que trabalham com a extração do látex. Peças são pensadas e inspiradas na Amazônia, de onde sai a matéria-prima
David Parry/Divulgação
“Você levar a borracha até as pessoas, é levar um pedacinho da Amazônia viva. É uma forma de contar a história, das pessoas saberem que tem gente que mora na floresta e protege ela”. Assim a designer brasiliense Flavia Amadeu define seu trabalho com a borracha amazônica.
Conhecida internacionalmente pelo seu trabalho com novas tecnologias em borrachas amazônicas há 15 anos, ela é PhD em design e sustentabilidade pelo London College of Fashion, mestre em artes visuais e bacharel em desenho industrial.
E é do Acre que sai parte da matéria-prima das peças da linha de joias orgânicas que ela faz. Em parceria com o Laboratório de Tecnologia Química da Universidade de Brasília (UNB), ela desenvolveu técnicas que transformam o látex em peças vendidas em diversos países.
Além de comprar o material, é a própria Flavia que percorre as comunidades capacitando os produtores para trabalharem com essa nova tecnologia. É um material que foi aperfeiçoado ao longo dos anos e está em constante aprimoramento.
Flavia explica que o trabalho, além de comercial, defende a bandeira da sustentabilidade e conservação dos conhecimentos tradicionais das comunidades que protegem e vivem da renda gerada pela Amazônia.
“Um dos diferenciais dessas novas tecnologias de borracha da Amazônia é justamente não precisar da indústria de processamento, então essa borracha colorida já sai da comunidade pronta pro mercado, dou treinamento para ela estar do jeito que preciso. Eu trabalho várias coisas, volto nas mesmas comunidades para fazer melhorias, as cores também são desenvolvidas por mim. É um trabalho de construção mesmo com eles [produtores], é bem legal que dá para ver as famílias se desenvolvendo”, explica.
Peças são inspiradas em pinturas indígenas, segundo a designer
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Pinturas indígenas inspiram
Assim que começou a estudar como a borracha poderia ser incluída na moda, seja por acessórios ou tecidos, Flavia conta que se reconectou com as ligações que teve com a Amazônia.
“A Amazônia aparece na minha vida antes da borracha. A minha graduação no desenho industrial foi uma coleção de moda inspirada nas pinturas indígenas dos índios kayapós e estudei várias etnias. Também fiz outros projetos relacionados com a Amazônia quando trabalhei como designer e quando tinha 15 anos fui pra floresta fazer uma imersão no curso de ecologia”, relembra.
Ao se deparar com o látex, ela lembrou de todas essas influências que sempre estiveram presentes na sua vida. Tanto que as peças são inspiradas em pinturas indígenas e são pensadas de uma forma que represente a Amazônia em um acessório.
“Percebi que tinha que ter um acabamento impecável, a peça é uma matéria-prima, no início ainda é bruta e não é fácil. Os seringueiros e os produtores sabem da qualidade que exijo, que precisa ter, para se tornar uma joia, quando criei demorei um tempo para colocar no mercado, porque queria um acabamento perfeito!” diz.
A designer diz ainda que não quis tirar as características da borracha, apenas lapidar de uma forma que ficasse uma peça realmente delicada e carregada de identidade.
“Pensei muito em como fazer esse material [borracha] falar por si só, tirando os excessos, tirando tudo que não precisava, porque se você coloca muita coisa, acaba virando outra coisa, a borracha não aparece. Ela é uma matéria-prima, mas se torna joia pelo design e é esse mesmo design que vai contar essa história da floresta”, pontua.
Flavia percorre comunidades amazônicas para ensinar técnica da borracha colorida
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Fortalecimento de produtores
Entre Acre e o Pará, ela diz que trabalha com cerca de 100 produtores de vários tipos de borracha.
“Hoje eu trabalho com cooperativas e associações, principalmente em Feijó, Tarauacá, fiz trabalhos em Sena Madureira, já trabalhei com várias borrachas, não só coloridas”, diz.
Além disso, Flavia tenta incentivar que os produtores se dediquem ao artesanato local usando a borracha como matéria-prima. Em Cruzeiro do Sul, por exemplo, ela esteve em comunidades indígenas ensinando a técnica para que eles pudessem ter uma nova alternativa.
“O que acho bem legal é que tem a questão de gerar renda na floresta e as pessoas continuarem preservando essa área de árvores nativas que geram renda. É uma valorização do seringueiro, porque você está levando essas borrachas, que traz atenção para a Amazônia, mas também para as pessoas que foram anônimas por muito tempo. É bem legal a possibilidade do artesanato local, abre muitas possibilidades”, pontua.
E nas mãos de Flavia essa borracha ganha formato de joias finas e sofisticadas, que caíram no gosto dos consumidores do Brasil, mas também de outros países. É um pedaço da Amazônia, da história da floresta que alguém adquire ao comprar uma peça.
Durante suas capacitações, a designer diz que tenta levar conhecimento às comunidades sobre a importância da preservação da floresta.
“Tem toda uma conexão do consumidor com a floresta e com o produtor. Quando dou capacitação na floresta, a gente conversa muito sobre a importância da floresta para que eles possam entender a própria importância deles. Isso é muito legal porque, muitas vezes, eles mesmos não têm consciência disso”, salienta.
Durante esse tempo, ela diz que as peças já foram vendidas, além do Brasil, na Inglaterra, Espanha, Estados Unidos, Canadá, Austrália, Holanda, Dinamarca, Alemanha e Itália.
Flavia diz que sua linha de joias também carrega um lema social que possibilita a conservação do conhecimento tradicional da floresta.
“Trabalho muito com inclusão feminina de jovens na cadeia produtiva, porque os filhos, os jovens adultos, não queriam mais trabalhar com a borracha e agora eles vêem novas possibilidades com esses materiais, então mantém o seringueiro na florestas, as famílias, aquele conhecimento tradicional que protege a floresta, a produção nativa. As árvores não são de plantação, isso é muito forte na Amazônia”, finaliza.
Matéria -prima usada por Flavia nas peças são do Acre e Pará
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