Alta da energia produzida pela usina, que é cotada em dólar, prejudica consumidores do Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Ministério de Minas e Energia diz que pode agir para ‘mitigar impactos’. A hidrelétrica de Itaipu: disparada do dólar está encarecendo energia produzida pela usina.
SkyTakes / Árvore Filmes/ Itaipu Binacional
A disparada do dólar, causada por temores relacionados à epidemia do coronavírus, que tem afetado mercados, investidores e empresas, deve provocar também aumento das contas de luz em boa parte do país, situação que já preocupara autoridades do setor elétrico.
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O motivo é a hidrelétrica de Itaipu. A maior usina do país, responsável por atender a cerca de 10% de toda a demanda nacional, tem a energia cotada em dólar (leia mais abaixo).
Isso significa que, quanto mais o dólar se valoriza em relação ao real, mais cara fica a energia de Itaipu. Em 2020, até 18 de março, a moeda norte-americana acumulava alta de 29,57%.
O encarecimento da energia de Itaipu já está deixando as tarifas de energia mais caras.
No início de março, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou o reajuste das tarifas da Light, distribuidora que atende a uma parte do estado do Rio de Janeiro. Do aumento autorizado, de 6,21% na média, 1,77 ponto percentual se deveu à alta na energia de Itaipu.
Ministério diz que pode agir
O Ministério de Minas e Energia informou que está acompanhando a disparada do dólar e que, se for necessário, pode vir a adotar medidas nos próximos meses para aliviar os efeitos nas contas de luz.
“Para situações extraordinárias, existem nos contratos de concessão cláusulas que estabelecem a forma de atuação da Agência Nacional de Energia Elétrica para sanar tal situação, dependendo do impacto para cada distribuidora. Não obstante, o governo está atento ao contexto econômico excepcional e, a depender das repercussões da variação cambial ao longo deste período, poderá ser proposta alguma medida de mitigação de impactos”, informou o ministério.
Ainda de acordo com o MME, o governo brasileiro está negociando com o paraguaio, seu sócio na usina, a revisão do Tratado de Itaipu. Uma das mudanças em debate é justamente a cotação em dólar da energia da hidrelétrica, mas qualquer mudança, segundo o ministério, valeria apenas a partir de 2023.
O MME ressaltou, porém, que “os efeitos da variação do dólar não são repassados de imediato às tarifas dos consumidores”, ou seja, que isso só aconteceria após a revisão tarifária anual de cada distribuidora.
Em entrevista ao G1, o diretor-geral da Aneel, André Pepitone, admitiu que a recente disparada do dólar, e seus efeitos na energia de Itaipu, preocupam.
“Com essa escalada do dólar, o custo da geração tem crescido, tem ganhado maior representatividade e está pressionando as tarifas para cima”, disse Pepitone. Segundo ele, a agência ainda não tem estimativa do impacto nas tarifas das demais distribuidoras.
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Sul, Sudeste e Centro-Oeste
O encarecimento da energia de Itaipu prejudica especificamente os consumidores das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Isso porque a legislação estabelece que são as distribuidoras dessas três regiões as responsáveis por comprar a energia da usina.
Essa regra, e a que prevê a “dolarização” da energia de Itaipu, estão previstas no tratado assinado em 1973 pelos governos de Brasil e Paraguai, responsáveis pela construção e operação da usina.
No caso da Light, do total de energia contratada para atender aos seus clientes no Rio, 16,4% vem de Itaipu.
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A distribuidora informou que, para o cálculo do reajuste de suas tarifas no início de março, a Aneel considerou a energia da usina a um valor de R$ 281,87 por megawatt-hora (MWh). No reajuste do ano passado, esse valor era de R$ 236,65 por MWh.
Se nos próximos meses o dólar continuar a se valorizar, ou mesmo se mantiver a cotação atual em relação ao real, deve contribuir para encarecer as contas de luz também em 2021.
“Caso o dólar se mantenha em patamares elevados (acima de 4,33), as diferenças em relação à cobertura tarifária vigente serão repassadas aos consumidores no reajuste tarifário de 2021”, informou a Light. Por outro lado, porém, se houver redução, pode contribuir para baratear as contas de luz.
Na Cemig, que atende aos consumidores de Minas Gerais, Itaipu representa cerca de 20% dos custos com compra de energia.
O reajuste da tarifa da distribuidora mineira será anunciado em maio, mas ela informou que ainda não é possível dizer se, devido à disparada do dólar, haverá aumento, já que a análise para o reajuste da tarifa considera outros fatores.
Entretanto, a própria Cemig aponta que, nos últimos 12 meses, o preço pago por ela pelo megawatt-hora da energia de Itaipu teve aumento de 20%: passou de R$ 245,30, em março de 2019, para R$ 295,65, em fevereiro de 2020.
“Hedge”
O presidente da Abradee, associação que representa as distribuidoras, Marcos Madureira, defende que o governo regulamente uma operação financeira, conhecida como “hedge”, para proteger o setor elétrico, e os consumidores, de bruscas variações do dólar.
“Deveria ter uma forma de proteger a tarifa dessas variações cambiais”, disse Madureira. “Já tínhamos sugerido que a Eletrobras e a União pudessem fazer a contratação [do mecanismo de proteção] junto ao Banco Central. Com isso, a gente não teria essa volatilidade”.
Madureira apontou que, apesar de reflexos da oscilação do dólar serem repassados aos consumidores apenas após o reajuste tarifário anual, para as distribuidoras a alta no valor da energia de Itaipu gera impacto financeiro imediato.
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