Agora, os indígenas poderão retomar a utilização a área designada no documento para a produção agrícola mecanizada a fim de vender no mercado externo. Área plantada com pequi em terra indígena
Fábio Nascimento/ISA
Um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi assinado nesta semana para regularizar a produção agrícola, por meio de lavouras mecanizadas, nas Terras Indígenas Rio Formoso, Paresi, Utiariti, Tirecatinga e Irantxe, em Mato Grosso.
O documento foi assinado pelo Ministério Público Federal (MPF) pela Fundação Nacional do Índio (Funai), pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e pelas Cooperativas Agropecuária dos Povos Indígenas Haliti, Nambikwara e Manoki (Coopihanama) e dos Produtores Rurais da Cultura Mecanizada da Etnia Paresi de Tangara da Serra/MT (Coopermatsene).
Agora, os indígenas poderão retomar a utilização a área designada no documento para a produção agrícola mecanizada a fim de vender no mercado externo.
Após anos de discussão com a Funai e o Ibama, as negociações do TAC tiveram início em setembro do ano passado e se estenderam até outubro deste ano, quando o texto foi finalmente fechado com as procuradorias federais dos dois órgãos e foi possível desembargar as áreas para que os indígenas voltassem a plantar, agora de forma correta, atendendo o que preconiza a lei.
Com a assinatura do TAC, os indígenas se comprometem a respeitar a posse e o uso coletivo do solo das TIs, sendo utilizados para o plantio de lavoura ou outras atividades agropecuárias, sempre com decisão coletiva da comunidade e seguindo suas diretrizes, ferramentas e tecnologias sustentáveis, buscando parcerias e convênios com órgãos de pesquisa e assistência rural. Além disso, deverão desenvolver programas de incentivos às roças tradicionais e elaborar e implementar um sistema de repartição justa de benefícios, que atenda toda a comunidade, independentemente do envolvimento direto com a atividade agropecuária, assim como um plano de aplicação dos lucros.
Os indígenas também se comprometeram a respeitar a legislação ambiental e não utilizar sementes nem plantas geneticamente modificadas, assim como não realizar a ampliação da área de plantio, conforme consta do documento. A exploração da terra e o desenvolvimento da atividade agrícola na TI deverá respeitar o usufruto exclusivo previsto no art. 231 da Constituição Federal, ou seja, deverá ser feita exclusivamente por indígenas, não celebrando contratos que possam caracterizar arrendamento ou parceria com não-índios, sob pena de rescisão do TAC e retorno dos embargos anteriormente impostos pelo Ibama. O prazo para que o processo de licenciamento da atividade agrícola, objeto do TAC, seja iniciado pelos indígenas é de um ano, a contar da data da assinatura do termo.
O caso
O processo que levou à assinatura do TAC teve início em 2013, quando as comunidades indígenas Paresi, Nambikwara e Manoki protocolaram ofício junto ao Ibama solicitando orientações para realizar o licenciamento ambiental da área plantada. A partir desse ofício, foi aberto o processo de registro das Terras Indígenas Rio Formoso, Paresi, Utiariti, Tirecatinga e Manoki no Cadastro Ambiental Rural (CAR).
Já em 2015, a Funai encaminhou ofício ao Ibama se posicionando favoravelmente à regularização ambiental e, com isso, o Instituto Ambiental sugeriu a formalização de um TAC seguido de um requerimento de licenciamento ambiental. No mesmo ano, na Conferência Nacional de Política Indigenista, realizada em Brasília, foi aprovada em plenária uma moção de apoio referente ao projeto das lavouras mecanizadas das etnias Paresi, Nambikwara e Manoki.
No ano passado,as lavouras foram cadastradas pelo Instituto de Defesa Agropecuária em Mato Grosso (Indea/MT) para efeito de vigilância sanitária. No mesmo ano, teve fim o prazo de um Compromisso de Ajustamento de Conduta firmado anteriormente apenas entre os indígenas e a Funai, o que ocasionou o encerramento dos contratos de arrendamento e/ou parcerias agrícolas nas TIs. Naquele mesmo ano, porém, pelo fato de os indígenas terem plantado grãos transgênicos, o que é proibido pela legislação brasileira em áreas protegidas, houve aplicação de multas e embargos pelo Ibama.
Com as áreas embargadas, os indígenas ficaram impedidos de plantar e, mais ainda, de comercializar a produção. Além disso, a falta de linhas de créditos regulares, sejam públicas ou privadas, dificulta a produção agrícola dos indígenas, que, no passado, tiveram que recorrer às parcerias e/ou arrendamentos, que são ilegais.
Diante do firme propósito externado pelos indígenas de manter as lavouras mecanizadas respeitando a legislação ambiental e o usufruto exclusivo, o MPF tomou a iniciativa de buscar, junto ao Ibama e à Funai, a assinatura de um TAC que possibilitasse o desembargo das áreas. Além disso, o MPF tem trabalhado pela implantação de um projeto a ser elaborado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e pela Funai para dar assistência e crédito aos indígenas. “Ao fim das negociações foi possível conciliar a proteção ambiental, o usufruto exclusivo e a autodeterminação dos povos indígenas, tudo sem a necessidade de qualquer alteração legislativa ou constitucional que, na verdade, pode prejudicar sobremaneira os direitos dos Povos Indígenas no país”, concluiu o procurador da República.
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