Decisão do governo de facilitar acionamento das usinas termelétricas vai impactar na conta de luz
O governo federal prepara uma medida provisória que deve ampliar os poderes do Ministério de Minas e Energia na gestão dos recursos hídricos do país – incluindo os reservatórios das hidrelétricas – em detrimento de outros órgãos, como o Ibama ou a Agência Nacional de Águas. É mais uma ação na tentativa de evitar racionamento.
O blog teve acesso à minuta preparada pelo próprio ministério. A proposta de MP cria a Câmara de Regras Operacionais Excepcionais para Usinas Hidrelétricas (Care), que passaria a gerenciar a vazão das usinas hidrelétricas.
O foco é, de maneira urgente e temporária, direcionar a utilização dos recursos hídricos para a garantia de produção de energia elétrica.
O texto informa que os custos da implementação das medidas por parte dos concessionários de geração de energia serão repassados para a conta dos Encargos de Serviço do Sistema – que é paga por todos os consumidores.
Governo emite alerta para crise hídrica em cinco estados
Ao dar prioridade à geração de energia, o governo ameaça outros usos da água dos reservatórios, como agricultura e irrigação, transporte fluvial e turismo.
A situação é semelhante à da crise hídrica de 2014 e 2015, em que a Hidrovia Tietê-Paraná chegou a perder condições de navegação por conta do baixo nível de águas. A hidrovia é importante para o escoamento de parte da produção de grãos do país.
Fontes ouvidas pelo blog afirmam que a pasta de Minas e Energia gostaria de publicar a medida provisória ainda esta semana. A oficialização da proposta, no entanto, pode ficar para a semana que vem em função da MP da Eletrobras, que ainda tramita no Senado.
Íntegra
Leia, a seguir, a íntegra da proposta de medida provisória a que o blog teve acesso:
MEDIDA PROVISÓRIA No xxx, DE xx DE JUNHO DE 2021
Institui a Câmara de Regras Operacionais Excepcionais para Usinas Hidrelétricas (CARE), tendo em vista a atual situação de escassez de água e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei:
Art. 1º Fica instituída a Câmara de Regras Operacionais Excepcionais para Usinas Hidrelétricas – CARE, com o objetivo de estabelecer, excepcionalmente, limites de uso, armazenamento e vazão das usinas hidrelétricas, com o propósito de otimizar a utilização dos recursos hídricos disponíveis para enfrentar a atual situação de escassez hídrica.
§ 1º A primeira reunião da CARE ocorrerá no prazo máximo de 3 dias úteis a contar da publicação desta Medida Provisória, ocasião na qual serão estabelecidas as regras de funcionamento da Câmara.
§ 2º As decisões da CARE obedecerão às prioridades de que trata o inciso III do art. 1º da Lei nº 9.433, de 08 de janeiro de 1997, e os efeitos sobre a confiabilidade do sistema elétrico em âmbito nacional.
Art. 2º À CARE compete:
I – decidir pela modificação excepcional e temporária das restrições operativas das usinas hidroelétricas no território nacional visando garantir a governabilidade (ou gestão) dos reservatórios das usinas hidrelétricas;
II – estudar e aprovar soluções temporárias ou definitivas que permitam atenuar o impacto das modificações de que trata o inciso I deste artigo sobre os demais usuários de recursos hídricos, particularmente os impactos causados por modificações de vazões em trechos de rios e de níveis de água nos reservatórios;
III – definir o órgão ou a entidade da Administração Pública Federal, direta ou indireta, ou a instituição do setor elétrico regulada e instituída por lei, responsável pela implantação das ações necessárias para a mitigação de impactos de que trata o inciso II, de acordo com suas competências;
IV – articular-se com os Poderes da União e dos demais entes federados objetivando a implantação das providências determinadas pela CARE.
§ 1º As solicitações e determinações da CARE aos órgãos, entidades e instituições de que trata o inciso III deste artigo serão atendidas em caráter prioritário, no prazo por ela assinalado.
§ 2º As modificações de que trata o inciso I deste artigo, considerando os limites de uso, armazenamento e redução de vazões em corpos hídricos, deverão:
I – observar que as vazões reduzidas sejam maiores do que as que ocorreriam em condições naturais, caso não existissem barragens na bacia hidrográfica; e
II – ser implementadas no prazo assinalado pela CARE.
§ 3º Os órgãos ou entidades responsáveis pelo licenciamento ambiental de usinas hidrelétricas e a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) deverão indicar à CARE as medidas de monitoramento, mitigação e compensação para os impactos ambientais e de uso múltiplo dos recursos hídricos dos trechos de rios afetados pela redução de vazão de que trata o § 2º deste artigo no prazo assinalado pela CARE.
§ 4º Os custos incorridos pelos concessionários de geração de energia elétrica para a implementação das medidas de monitoramento e mitigação dos impactos ambientais, decorrentes das ações que trata o inciso II deste artigo, que não forem cobertos pelos termos dos contratos de concessão, poderão ser arcados pelos agentes do Setor Elétrico e arrecadados por meio dos Encargos de Serviço do Sistema – ESS de que trata o §10 do Art. 1º da Lei nº 10.848, de 15 de março de 2004, desde que reconhecidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).
Art. 3º A CARE é composta pelos seguintes membros:
I – Ministros de Estado:
a) de Minas e Energia, que a presidirá;
b) Chefe da Casa Civil da Presidência da República, o seu vice-presidente;
c) do Desenvolvimento Regional;
e) do Meio Ambiente;
f) da Infraestrutura; e
f) Advogado-Geral da União;
II – Dirigentes máximos das seguintes entidades:
a) Agência Nacional de Energia Elétrica;
b) Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico; e
c) Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis;
III – Diretor-Geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico;
IV – Presidente da Empresa de Pesquisa Energética; e,
V – Outros membros designados pelo Presidente da República.
§ 1º Somente os Ministro de Estado terão direito a voto nas decisões da CARE.
§ 2º Poderão ser convidados a participar das reuniões da CARE técnicos, autoridades e representantes de órgãos e entidades públicos e privados.
§ 3º A Secretaria de Comunicação de Governo da Presidência da República e o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República prestarão assessoramento à CARE.
§ 4º O Presidente da CARE poderá praticar os atos previstos no art. 2º ad referendum da Câmara.
§ 5º A Secretaria-Executiva da CARE será exercida pelo Ministério de Minas e Energia.
§ 6º O Presidente da CARE poderá requisitar, sem prejuízo dos direitos e das vantagens a que façam jus nos respectivos órgãos e entidades de origem, servidores e empregados públicos, da Administração Pública Federal, direta e indireta, para auxiliar os trabalhos da Câmara, nos termos da Lei nº 9.007, de 17 de março de 1995.
Art. 4º. As deliberações emanadas pelo Comitê de Monitoramento do Sistema Elétrico – CMSE, instituído pelo art. 14 da Lei nº 10.848, de 2004, a partir da publicação desta Medida Provisória e até 30 (trinta) de dezembro de 2021, terão caráter determinativo para os órgãos, entidades e instituições de que trata o inciso III do art. 1º e para os concessionários e autorizados dos setores de energia elétrica e petróleo e gás natural e biocombustíveis.
§ 1º Os custos incorridos pelos concessionários e autorizados dos setores de energia elétrica e petróleo e gás natural e biocombustíveis para a implementação das medidas decorrentes das determinações de que trata o caput, que não forem cobertos pelos termos dos contratos de concessão e de autorização, poderão ser arcados pelos agentes do Setor Elétrico e arrecadados por meio dos Encargos de Serviço do Sistema – ESS de que trata o §10 do Art. 1º da Lei nº 10.848, de 2004, desde que reconhecidos pela agência reguladora competente.
§ 2º Sem prejuízo de medidas de outra natureza, as determinações de que trata o caput poderão compreender o estabelecimento de programa prioritário de termeletricidade e de programa de racionalização compulsória do consumo de energia elétrica.
§ 3º As contratações decorrentes de eventual programa prioritário de termeletricidade, previsto no § 2º deste artigo, ocorrerão nos termos dos arts. 3º e 3º-A da Lei nº 10.848, de 2004.
Art. 5º. A CARE será extinta em 30 (trinta) de dezembro de 2021.
Parágrafo único. As ações de médio e longo prazo definidas pela CARE deverão ser implementadas mesmo após sua extinção pelos órgãos, entidades e instituições de que trata o inciso III do art. 1º, a quem a CARE atribuir essa competência.
Art. 6º. Esta Medida Provisória entra em vigor na data de sua publicação.
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