Levantamento feito pela Hutukara Associação Yanomami foi apresentado nesta terça-feira (25). Relatório nomeou resultado da exploração ilegal na área indígena como a nova “Serra Pelada”, conhecido como maior garimpo a céu aberto do mundo. Canteiro de garimpo no Uraricoera
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O garimpo ilegal na Terra Yanomami, localizada na região Norte de Roraima, degradou cerca de 200 hectares de floresta — o equivalente a 200 campos de futebol — somente no primeiro trimestre deste ano. A informação foi divulgada pela Hutukara Associação Yanomami (HUY), por meio de relatório apresentado nesta terça-feira (25).
Imagens aéreas na região mostram áreas devastadas pelo avanço do garimpo ilegal. Segundo o documento, que o G1 teve acesso, foram registradas “crateras profundas, acampamentos colados a aldeias e até restaurante de garimpeiros”.
Ao total, imagens de satélite indicam cerca de 2.430 hectares destruídos pelo garimpo. A associação nomeou o resultado da exploração ilegal na área indígena como a nova “Serra Pelada”, lugar que ficou conhecido como o maior garimpo a céu aberto do mundo, localizado no Sudeste do Pará.
“Currutela” no alto Catrimani, além de pista de pouso clandestina, aeronaves dão suporte à atividade.
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As imagens foram registradas durante dois sobrevoos realizados nos dias 7 e 9 de abril, informou a Hutukara. O relatório, que contém 47 páginas, também detalhou o registro de:
Fotografias de alta resolução de acampamentos e canteiros;
Fotos panorâmicas do impacto do garimpo no alto curso dos rios Catrimani, Mucajaí e Parima;
Documentação da “currutela” — nome dado ao local onde ocorrem venda de bebida alcoólica e prostituição — do alto Catrimani;
Identificação de uma pequena balsa em atividade no rio Ajarani;
Verificação da continuidade da atividade garimpeira em zonas que receberam operações recentes;
Flagrantes do uso de pistas comunitárias por parte dos garimpeiros nas regiões de Homoxi e Kayanau.
Cratera em acampamento de garimpo na Terra Yanomami
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O documento também detalha todos os pontos da região onde há indícios evidentes da atividade mineradora ilegal. A primeira rota foi direcionada à porção central da Terra Yanomami, sobre os rios Apiaú, Catrimani e Ajarani e na Serra da Estrutura.
Já a segunda rota sobrevoou as comunidades de Aracaçá, Homoxi, Kayanau, Palimiú, Papiú, Parima, Waikás e Xitei.
A Terra Yanomami é palco de diversos ataques há anos. Em 1993, garimpeiros promoveram uma chacina contra os Yanomami, na qual 16 indígenas morreram. O episódio ficou conhecido como o Massacre de Haximu, tendo sido o primeiro caso de genocídio reconhecido pela Justiça brasileira.
Em junho do ano passado, outro conflito na Terra resultou na morte de dois jovens indígenas, de 20 e 24 anos. De acordo com o Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kuana (Condisi-Y), os jovens estavam em um grupo de cinco indígenas quando se depararam com dois garimpeiros armados próximo a uma pista clandestina para pouso de helicóptero.
Helicóptero em outra pista clandestina no alto Catrimani. Ao lado esquerdo, há cerca de 4,8 hectares degradados.
Divulgação/HAY.
Neste mês de maio, a região mais uma vez sofreu diversos ataques de garimpeiros armados. O caso, que iniciou no dia 10, teve dez dias seguidos de conflitos. Na ocasião, três garimpeiros morreram e quatro ficaram feridos, além de um indígena baleado de raspão na cabeça, na comunidade Palimiú, às margens do rio Uraricoera.
Segundo a HAY, o conflito teria sido em retaliação, após os Yanomami instalarem uma barreira sanitária, para impedir que os garimpeiros usassem o rio Uraricoera para chegar a um de seus acampamentos.
Cinco dias após esse ataque, líderes indígenas relataram a morte de duas crianças Yanomami, de 1 e 5 anos. Conforme informação divulgada pela Hutukara, os corpos das vítimas foram encontrados boiando no rio, no dia 12 de maio.
Em nota divulgada à impressa, a associação acredita que, após os tiros, muitas crianças correram assustadas para se proteger, se perderam no mato e ficaram desaparecidas. A informação foi relatada, inclusive, ao Ministério Público Federal (MPF).
A estimativa é que mais de 20 mil garimpeiros atuam infiltrados na Terra Yanomami. A área é o maior território indígena do país dividido entre Roraima e o Amazonas. Segundo o Instituto Socioambiental (ISA), há 26.780 indígenas vivendo na região.
Campo de garimpo na Terra Yanomami
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Para a organização, essas invasões de garimpeiro às Terras só serão controladas se houver operações “mais abrangentes e eficientes na destruição da estrutura de apoio à atividade ilegal”.
A Hutukara sugere como métodos eficazes, a explosão de pistas e destruição de currutelas, inutilização do maquinário como motores, balsas, aeronaves, helicópteros e quadriciclos, além da “descapitalização” de investidores do setor.
“Não se trata de um problema sem solução. O estado possui todas as condições para fazer valer a lei e promover a neutralização dos crimes praticados pelo garimpo contra os indígenas da TI Yanomami e o restante da sociedade brasileira”, reforçou o relatório.
Registro de canoa transportando insumos para o garimpo
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Ainda conforme o relatório, “a crise econômica e o preço do metal estimulam os garimpeiros à atividade exploradora”. A organização afirma que a presença dos garimpeiros na região, promove o desmatamento, a contaminação dos rios por mercúrio, a violência contra homens, mulheres e crianças indígenas e a disseminação da Covid-19 no território indígena.
Conforme o último boletim da Secretaria de Saúde (Sesau) dessa segunda-feira (24), já são 5.739 indígenas infectados e outros 83 mortos por conta do vírus. Os dados são dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) Leste e Yanomami.
Regiões sobrevoadas sublinhadas em amarelo e roxo. Os pontos vermelhos representam as áreas de garimpos encontradas e em cinza a área já desmatada
Divulgação/HAY
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