Das grandes varejistas às pequenas e médias empresas, comerciantes se digitalizaram durante o isolamento social para conter o coronavírus e apostam na data para compensar parte das perdas que tiveram. Magazine Luiza: vendas da empresa no e-commerce cresceram 148% no terceiro trimestre de 2020.
Divulgação/Magazine Luiza
A diminuição dos gastos com serviços e a alta digitalização dos negócios durante a pandemia do novo coronavírus criaram a equação para uma Black Friday histórica em 2020. É essa a previsão das principais empresas de análise de mercado consultadas pelo G1 sobre a data comercial.
A Neotrust/Compre&Confie estima que a Black Friday deste ano será 77% maior que a do ano passado, com quase 11 milhões de pedidos e R$ 6,9 bilhões em faturamento. A Ebit|Nielsen é mais conservadora e acredita em uma alta de 27% nas vendas comparadas a 2019.
Black Friday: lojas antecipam preparativos para aproveitar mudanças causadas pela pandemia
A data sempre foi um marco das vendas digitais e promete ser uma prova de fogo do e-commerce brasileiro em ano de pandemia. O efeito das restrições às lojas físicas farão crescer em 70% o comércio eletrônico neste ano, segundo projeção da Neotrust. E o movimento não se limitou aos grandes varejistas, já que pequenas e médias empresas também tiveram 118% de crescimento de faturamento online apenas entre fevereiro e agosto.
“A pandemia deu resposta brusca a quem acreditava que poderia viver só no varejo físico. O modelo de sucesso é integração total, seja para utilizar loja como showroom ou ponto de coleta de produto”, diz André Ricardo Dias, CEO da Neotrust/Compre&Confie.
Desafio no digital
Lojas e grandes varejistas antecipam preparativos para a black friday deste ano
Ainda que a digitalização tenha sido intensa nos últimos meses, a Black Friday, em anos anteriores, chegava a concentrar quase 20 dias da atividade de um e-commerce em dia normal. Neste ano, a Neotrust estima que o tráfego será por volta do dobro.
Quem aposta na data para recuperar um pouco do faturamento perdido na pandemia precisa escolher entre acertar um esquema difícil de logística para atender bem ou partir para os marketplaces, como são chamadas as lojas virtuais hospedadas em sites de grandes varejistas.
Na última pesquisa feita pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), entre 27 e 31 de agosto, 67% dos pequenos negócios disseram que estavam vendendo por meio das plataformas digitais. E 16% dos que ainda não vendiam pela internet iriam adotar a prática em breve.
Fernanda Micelli, dona da empresa O Tal do Congelado: uma das três lojas físicas pode ser fechada para priorizar recursos para vendas digitais.
Arquivo pessoal
É o caso da empresária Fernanda Micelli. Dona de uma rede de lojas de alimentos congelados, estruturou um rodízio entre suas cinco funcionárias e deu prioridade ao delivery. Das três lojas na zona sul de São Paulo, Fernanda decidiu fechar duas em março por conta da pandemia.
A marca tinha um site apenas para exibição, mas passou a servir de vitrine digital de produtos. Junto, há um cardápio digital em que o cliente seleciona o prato que deseja. A escolha gera um link para que o cliente entre em contato com uma das lojas por WhatsApp.
“As vendas pelo aplicativo cresceram muito durante a pandemia. Por isso, contratamos também um serviço que gerencia números de celular, salva contatos de clientes e transfere conversas de uma loja para outra”, diz Fernanda.
O delivery passou de 30% para 60% do faturamento da empresa. E, comparado ao período pré-pandemia, as vendas aumentaram 30%. O resultado promissor a faz cogitar o fechamento de uma das unidades físicas em 2021.
O WhatsApp, inclusive, é o modo preferido entre as pequenas e médias empresas para articular as vendas, segundo o Sebrae. Em seguida, vêm redes sociais, como Facebook e Instagram. Mas a maioria dos empreendedores trabalha com uma digitalização mais simples dos negócios, sem automação.
“Os marketplaces também cresceram demais, mas é para uma empresa que já se estruturou um pouco mais, porque tem que atender o Brasil inteiro. Boa parte só atende a região”, afirma Cesar Rissete, gerente de competitividade do Sebrae.
WhatsApp: Anúncio feito em outubro — mas sem prazo para início — diz que contas comerciais poderão vender produtos direto do aplicativo.
Diviulgação/WhatsApp
Sabendo da preferência e tentando se agarrar ao público, o WhatsApp tenta trazer uma plataforma de pagamentos para dentro do sistema.
O WhatsApp Pay chegou a ser anunciado em junho, fechada uma parceria com a Cielo, mas foi impedido de operar pelo Cade e pelo Banco Central para que se montasse uma adequação ao Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB). Segundo o BC, o prazo final para decidir os pleitos relacionados ao WhatsApp Pay expira em meados de julho de 2021.
No final de outubro, a empresa tentou um novo caminho: oferecer um recurso de finalização de vendas dentro das conversas do aplicativo. Versões comerciais do app terão disponível um botão de compra para que os usuários saibam que a empresa oferece um catálogo.
“No futuro, também será possível adicionar itens ao carrinho, finalizar a compra e, por fim, pagar diretamente no aplicativo”, informou a empresa em nota ao G1.
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Corrida pelos parceiros
Quem aposta nos marketplaces precisa ter confiança no sistema das plataformas digitais. Exemplo de falha de sistema foi a queda do serviço da empresa de entregas iFood no último Dia dos Namorados.
Sem operar os pedidos, restaurantes perderam oportunidades ao longo de toda a noite do dia 12 de junho, quando o isolamento social era mais rígido e a dependência dos app para um bom faturamento era ainda maior. Procurada, a empresa não comentou o incidente.
O Sebrae incentiva que o empreendedor faça uma diversificação de plataformas, para que o empresário não fique preso a um único aplicativo ou loja virtual.
“Essa pulverização vale tanto pelo poder de concentração das plataformas, que podem elevar as taxas cobradas e corroer muito o retorno para o empresário, como por falhas do sistema mesmo”, diz Cesar Rissete, do Sebrae.
As grandes varejistas garantem que estão prontas para o tráfego intenso, tanto para atender aos parceiros como para vendas próprias.
O primeiro movimento foi antecipar as campanhas e ofertas de Black Friday para dissipar o movimento concentrado na data. Serve para não repetir quedas de sistema no digital, mas também para evitar aglomerações nas lojas físicas. Os descontos, inclusive, já podem ser encontrados nas lojas e parte deles até termina antes da data, 27 de novembro, para que interessados acelerem a compra.
O estímulo ao digital tem também, como pano de fundo, um forte interesse das empresas nos dados que clientes podem oferecer. O que é procurado, visualizado e comprado abastece as varejistas com indicativos de comportamento do consumidor. Esse “mapa” se transforma em melhores anúncios publicitários, entre outros usos.
Dia do Solteiro na China movimenta comércio online
O Magazine Luiza, por exemplo, aumentou a base de empresas em seu marketplace durante a pandemia com uma campanha de atração chamada “Parceiro Magalu”. O número de lojistas cresceu 250% no terceiro trimestre de 2020 comparado ao mesmo período de 2019, e funcionou para aumentar o sortimento de produtos dentro do aplicativo da empresa.
“O marketplace traz um básico completo para esse comerciante, que é tráfego bom, uma vitrine exposta e só paga se vender. Tudo com uma marca que chancela tudo isso”, afirma Mariana Castriota, gerente de marketplace do Magazine Luiza.
A empresa aproveita momento privilegiado de sua operação digital, que cresceu 148% no terceiro trimestre e passou a representar 66% do faturamento total.
O relacionamento também foi prioridade na OLX, mas a real inovação dentro dos sistemas da empresa foi a adesão à carteira digital. Batizada de OLX Pay, passou a operar em julho.
“É mais um passo do movimento de digitalização completa, que esperamos que acelere o crescimento de compras dentro da OLX. Investimos também em conteúdo e instruímos vendedores a fazer demonstração de carros e apartamentos por vídeo, por exemplo. É preciso mudar a maneira de trabalhar”, diz Andries Oudshoorn, CEO da OLX Brasil.
O Mercado Livre, que se tornou a maior empresa da América Latina durante a pandemia, priorizou um ecossistema de vitrine, venda e logística para auxiliar quem escolhe vender em sua plataforma. Partiu da empresa argentina o movimento mais agressivo para eficiência de entregas, com a integração à sua plataforma logística de uma frota de quatro aviões exclusivos para distribuição de produtos, reduzindo a dependência dos Correios.
Além disso, foram anunciados cinco novos centros de distribuição no país: três em São Paulo, um em Santa Catarina e outro em Minas Gerais. Os galpões servem para a modalidade de serviço em que a logística de parceiros, do armazenamento à entrega, é feita pelo Mercado Livre. Cerca de 80% do que sair de lá será entregue em até dois dias na Black Friday, segundo a empresa.
“Temos mais de 52 milhões de usuários por mês, oferecemos transações financeiras e crédito pelo Mercado Pago, e serviços logísticos de alto nível. O vendedor fica focado no seu negócio e, por isso, deu tão certo”, diz Julia Rueff, diretora de marketplace do Mercado Livre.
Mercado Livre: quatro aviões foram integrados à malha logística da empresa para acelerar entregas
Vinicius Stasolla/DonVisual
Consumidor habituado
Na outra ponta, a ansiedade com uma boa Black Friday tem por base a mudança de comportamento do comprador. De acordo com a pesquisa “Impactos da Covid-19 em Alimentos & Bebidas”, produzida pelo Ibope Inteligência e encomendada pelo Facebook IQ, 45% dos consumidores da classe C substituíram as compras em loja física por compras online. É um grande público, que não tinha costume de comprar por meio digital.
“O consumidor entendeu que pode comprar tudo pela internet. Nosso item mais vendido no segundo trimestre foi banana prata. As compras recorrentes são importante parte do faturamento”, diz Jean Lessa, diretor de tecnologia e marketplace da B2W Digital, empresa controladora de Submarino, Shoptime e Americanas.com.
“Mas, em 2019, a fatia das vendas digitais no total foi de quase 7% no Brasil contra 28% na China. Há um espaço enorme para crescer”, afirma.
A B2W foi a pioneira no modelo de marketplace no Brasil, mas aposta nas vendas recorrentes, como supermercados, farmácias e outros para retomar o posto de destaque perdido para o Magalu. Pelos resultados do terceiro trimestre deste ano, a empresa foi ultrapassada em vendas brutas totais pela internet, o GMV. Foram R$ 8,2 bilhões para o Magalu contra R$ 7,3 bilhões da B2W.
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Por fora, os mais novos correm atrás. A Via Varejo, dona de marcas como Casas Bahia e Ponto Frio, está apenas em seu segundo ano de investimento pesado em digital. Na Black Friday de 2019, tinha uma base de 8 milhões de clientes ativos. No fim do primeiro semestre de 2020, eram 15 milhões.
A empresa aposta, agora, em sua grande inovação dos tempos de pandemia para sua melhor Black Friday. Quando as lojas físicas foram fechadas, os vendedores foram “transferidos” para uma operação digital pelo WhatsApp.
“Com 22 mil vendedores habituados à prática de vender no ambiente digital, será uma experiência nova de não só ter os canais on e offline, mas a possibilidade de abordagem dessa equipe de venda, tanto para nossas marcas como parceiros de marketplace”, afirma Helisson Lemos, chief digital officer da Via Varejo.
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