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Guedes diz que é 'irresponsável' furar teto de gastos 'para fazer política, para ganhar eleição'

Ministro disse que concorda em alterar limite de gasto público para ‘salvar vidas’, por exemplo, em uma segunda onda da pandemia. Custeio do Renda Cidadã intensificou atritos no governo. Racha sobre financiamento do Renda Cidadã provoca reação no mercado financeiro
O ministro da Economia, Paulo Guedes, criticou em entrevista nesta sexta-feira (2) um suposto interesse em furar o teto de gastos da economia brasileira para “fazer política” e “ganhar eleição”.
“Uma coisa é você furar o teto porque você está salvando vidas em ano de pandemia, e isso ninguém pode ter dúvidas. Se a pandemia recrudescer e voltar em uma segunda onda, aí sim nós decisivamente vamos fazer algo a respeito. E aí sim, é o caso de você furar o teto”, declarou.
“Agora, você furar teto para fazer política, para ganhar eleição, para garantir, isso é irresponsável com as futuras gerações. Isso é mergulhar o Brasil no passado triste de inflação alta”, prosseguiu.
Guedes falou à imprensa após supostas críticas feitas pelo ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, em reunião com investidores na manhã desta sexta.
Furar teto de gastos ‘para fazer política, para ganhar eleição’ é irresponsável, diz Guedes
Segundo reportagem do serviço Broadcast, do jornal “O Estado de S. Paulo”, Marinho disse que foi Guedes o autor da proposta de usar dinheiro de precatórios para financiar o novo programa social do governo, chamado Renda Cidadã. O ministro da Economia rechaçou a ideia publicamente nesta quarta (30).
Mais cedo, Guedes já tinha dito que não acreditava nessas possíveis declarações. Mas disse também que, se Marinho falou isso, é “despreparado”, “desleal” e “fura-teto”.
Em nota divulgada pouco antes da fala de Guedes, o ministério informou que não houve “desqualificações ou adjetivações de qualquer natureza contra agentes públicos”.
Guedes diz que, se Marinho falou mal dele, é ‘despreparado’, ‘desleal’ e ‘fura-teto’
O ministro da Economia também foi questionado sobre outra possível fala de Marinho, que teria dito que o Renda Cidadã sairia “de qualquer jeito”.
“Isso é uma opinião dele. Ele deve estar mais informado do que eu, como não entendo nada de política, ele deve saber tudo de política, deve sair alguma coisa. O que eu digo é que temos o compromisso de manter o teto”, afirmou.
Guedes não respondeu se conversou com o ministro Marinho nesta sexta, mas disse que a relação deles está tranquila. “Tranquilo. Problema zero. Eu tenho a vantagem de ter essa transparência e espontaneidade e isso explica a minha confiança no presidente e a confiança do presidente em mim”.
Teto de gastos e Renda Cidadã
O teto de gastos citado por Guedes é uma regra criada em 2016 para segurar as despesas públicas do governo federal. Na prática, ele impede que os gastos do governo cresçam mais que a inflação do período, o que prejudicaria o controle da dívida brasileira.
O governo Jair Bolsonaro tenta viabilizar um programa social chamado Renda Cidadã para incorporar e substituir o Bolsa Família, aumentando o repasse por família. Mas, sob o teto de gastos, o governo ainda tenta encontrar a melhor forma de encaixar os custos adicionais no orçamento.
Nas últimas semanas, Bolsonaro já rejeitou em declarações públicas diversas opções sugeridas pela equipe econômica para abrir espaço nas tabelas – mudanças no abono salarial, no seguro-desemprego, no seguro-defeso e no piso das aposentadorias, por exemplo.
Na segunda (26), após reunião de Bolsonaro com ministros, equipe econômica e líderes partidários no Palácio da Alvorada, o senador Márcio Bittar (MDB-AC) anunciou duas novas ideias de fontes de recursos:
o dinheiro que, hoje, é reservado no orçamento para o pagamento de precatórios (dívidas do governo já reconhecidas pela Justiça);
e parte do Fundo Nacional de Desenvolvimento e Manutenção da Educação (Fundeb).
Relator diz que Renda Cidadã vai ser financiado com recursos do Fundeb e dos precatórios
As duas fontes sugeridas não levariam ao rompimento do teto de gastos. O dinheiro dos precatórios já está no orçamento, e seria apenas remanejado. O Fundeb não afeta o teto porque, quando foi criada, a regra de austeridade excluiu gastos com educação e saúde da trava constitucional.
A proposta apresentada, no entanto, sofreu críticas de entidades e de parlamentares e gerou impacto negativo no mercado. A ideia de adiar o pagamento de precatórios foi chamada de “calote”, e o uso do Fundeb foi visto como tentativa de “esconder uma fuga do teto”.
Fundeb: tirar dinheiro da educação básica para financiar o Renda Cidadã é ‘inconcebível’ e ‘contraditório’, dizem entidades
Usar verba de precatórios para financiar novo programa social é inconstitucional, diz OAB
Na quarta, Paulo Guedes afirmou que o objetivo do governo ao examinar a verba hoje prevista para precatórios não era o de financiar o Renda Cidadã, e sim, uma tentativa de manter despesas sob controle.
Paulo Guedes diz que governo não vai usar precatórios para financiar Renda Cidadã
Líderes partidários – que, assim como Guedes, participaram da reunião e do anúncio na segunda-feira – reagiram negativamente às declarações do ministro, informou o blog do Valdo Cruz.
Paulo Guedes tem atuado dentro do governo para que a regra do teto de gastos seja respeitada. Em agosto, após notícias de que o ministro Rogério Marinho era um defensor da flexibilização da regra do teto, o ministro da Economia conseguiu que o presidente Jair Bolsonaro se manifestasse publicamente a favor da regra e manifestasse o compromisso de que o governo respeitará o teto de gastos.
Como solução para as demandas por mais recursos para investimentos, a equipe de Paulo Guedes prometeu remanejar recursos para as pastas do Desenvolvimento Regional e de Infraestrutura. O projeto, enviado ao Congresso nesta quinta (1º), retira R$ 1,4 bilhão da Educação para reforçar os ministérios mais ligados às obras federais.
Eleições
Paulo Guedes afirmou que as eleições atrapalham esses debates, e ponderou que seria melhor discutir o novo programa social que vai substituir o Bolsa Família depois das eleições.
“Se você falar hoje que vai aterrissar em R$ 300 vão falar: não tem dinheiro para pagar, que absurdo. Se falar que é R$ 200, vão dizer: e os miseráveis? Na boca de uma eleição? Será que é essa a hora para falar disso?”, afirmou.
Guedes destacou, no entanto, que a o tempo quem define é a política. “Quem faz isso é a classe política. Quem dá o ‘time’ das reformas”, disse.
Segundo o ministro, o debate eleitoral também atrapalha outras pautas da agenda econômica, como a reforma tributária.
“Se não tiver a disputa eleitoral, nós vamos com a maior facilidade convergir. Com a disputa eleitoral qualquer coisa que um lado fala o outro lado cai de pau, em vez de ajudar cai de pau””
O ministrou voltou a defender a desoneração da folha de pagamento para todos os setores e admitiu que o governo atrasou no envio da proposta.
“Algumas coisas se atrasam. Do nosso lado atrasamos sim um pouco a reforma tributária, mas do lado de lá também atrasaram as privatizações. É verdade que atrasou as tributárias? É verdade. Eu perdi um secretário da Receita, um imposto que eu defendo para desonerar a folha de pagamentos foi interditado. Há uma luta política. Tem gente que quer aumentar imposto, nós não vamos aumentar imposto. Tem gente que quer furar teto, nós não vamos furar teto”.

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