O percentual representa 11,6 milhões de hectares de florestas públicas “tomadas” ao longo de 21 anos. Um igarapé no meio da Amazônia, na Floresta Nacional do Tapajós
Marcelo Brandt/G1
A Amazônia tem 23% de floresta em terras públicas não destinadas registradas ilegalmente como propriedades privadas, aponta um levantamento do Instituto Pesquisa Amazônia (Ipam) e do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA).
O percentual representa 11,6 milhões de hectares de florestas públicas “tomadas” ao longo de 21 anos (1997-2018). Ao todo, a Amazônia tem 49,8 milhões de hectares de florestas sem destinação.
A consequência da falta de destinação destas áreas é a invasão de grileiros e o aumento do desmatamento e das queimadas: as árvores são derrubadas e incendiadas para abrir espaço ao pasto e ao gado, dando aspecto de “produtividade” à área.
Os dados são do estudo “Terra sem lei na terra de ninguém: as florestas públicas não destinadas na Amazônia brasileira”, publicado nesta segunda-feira (22) no periódico “Land Use Policy”, da Elsevier.
Confira abaixo os destaques:
49,8 milhões de hectares de florestas na Amazônia não tem destinação
11,6 milhões de hectares destas florestas públicas não destinadas foram “tomados”
O número representa 23% das florestas não destinadas
Florestas em terras públicas não destinadas são áreas que não foram delimitadas como unidade de conservação, área quilombola, ou terras indígenas, por exemplo, mas pertencem ao poder público
Elas entram como “propriedade privada” no Cadastro Ambiental Rural (CAR), que é autodeclaratório – o sujeito entra no sistema, registra o georreferenciamento da terra, e declara propriedade
“É como se fosse terra de ninguém. Essas áreas precisam continuar públicas e continuar florestas”, afirma o diretor executivo do Ipam e um dos autores do estudo, Paulo Moutinho.
O cadastro no CAR precisa ser validado após fiscalização mas, como o processo é lento, muitas vezes a terra é vendida como se fosse regularizada e nem sempre o novo proprietário sabe da ilegalidade da transação.
O G1 entrou em contato com o Serviço Florestal Brasileiro e o Ministério do Meio Ambiente nesta terça-feira (23), mas até as 8h40 desta quarta não havia recebido resposta.
Regularização fundiária
Segundo Moutinho, a regularização fundiária da Amazônia precisa passar pela destinação das terras, como previa a Lei de Gestão de Florestas Públicas, aprovada pelo Congresso há 14 anos.
“Existe um problema fundiário sério na Amazônia. Há um caos. Parte desta solução é destinar para proteção, ou para terras indígenas ou para uso sustentável de terras naturais, como manda a lei de floresta pública de 2006. Na medida em que essas áreas públicas não são destinadas, em que você não diz em que tipo de categoria ela vai se encaixar, você abre um flanco grande para grilagem”, avalia.
Em dezembro de 2019, o governo federal publicou a medida provisória (MP) 910 sobre a regularização fundiária, que pretendia agilizar os processos e regulamentar o uso de terras no país.
O texto recebeu diversas críticas e a MP 910 não foi aprovada no Congresso. O motivo foi o impasse em torno do tamanho das áreas que poderão ser regularizadas por autodeclaração, sem passar por fiscalização. Segundo Moutinho, o texto abria brecha para regularizar grandes áreas, e não somente pequenas propriedades rurais.
Desmatamento
Vista áerea mostra área desmatada da Amazônia próxima a Porto Velho, em Rondônia, em setembro de 2019.
Bruno Kelly/Reuters
A análise de dados do Ipam e da UFPA aponta que 2,6 milhões de hectares de florestas em terras públicas não destinadas foram desmatados até 2018.
No período analisado (1997-2018), o acumulado de desmatamento foi 5,4 vezes maior na área federal do que na estadual.
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Dados mais recentes apontam que a tendência continua. Um outro estudo, feito pela organização Mapbiomas, apontou que 99% do desmatamento ocorrido em 2019 foi ilegal. Segundo os pesquisadores, mais de 60% da área desmatada está na Amazônia, com 770 mil hectares devastados.
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