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Economia

'Não temos um plano para vencer a crise', diz Ana Carla Abrão

Para a economista e ex-secretária da Fazenda de Goiás, país tem o desafio de repensar políticas de proteção social sem perder de vista a responsabilidade fiscal. Para a economista Ana Carla Abrão, ações coordenadas contra a crise econômica e um plano claro de saída no horizonte são armas fundamentais para vencer os efitos da pandemia do novo coronavírus. Mas, no Brasil, os atrasos causados pelo estica-e-puxa entre Executivo e Congresso podem colocar tudo a perder.
Nesta sexta-feira (29), o IBGE divulgou que o PIB brasileiro caiu 1,5% no 1º trimestre em meio aos primeiros efeitos da pandemia na produção. Nesta entrevista ao G1, a ex-secretária da Fazenda de Goiás e market leader da consultoria Oliver Wyman compartilha suas ideias e expectativas para a economia nos próximos meses.
O G1 entrevistou economistas para saber o que esperar depois da pandemia. Leia as demais entrevistas:
Eduardo Giannetti: ‘Estado brasileiro concentra renda e terá de ser repensado’
Nelson Marconi: ‘Não será o setor privado que vai tirar a economia do buraco’
Zeina Latif: ‘Imagem do país está muito ruim e isso vai cobrar um preço alto’
Ana Carla Abrão Costa: “Teremos que analisar como que reorganizaremos essa nossa rede proteção social de forma sustentável”
Daniel Teixeira/Estadão Conteúdo/Arquivo
Abaixo, os principais trechos da entrevista.
Quais são os principais pontos de atenção dos resultados do PIB? Qual a sua visão deste momento?
Definitivamente, essa crise tem uma característica de espalhamento que é muito diferente de crises anteriores. De forma geral, a economia como um todo está sofrendo – e vai continuar sofrendo enquanto a gente não voltar a um processo que seja o mais próximo do que a gente conhecia como normalidade.
Serviços devem aparecer caindo, além dos setores tradicionais: indústria, comércio, que já vinham mostrando fragilidade muito grande nos indicadores antecedentes. É um resultado do próprio processo de isolamento social e da crise de saúde, que faz com que as pessoas naturalmente se retraiam do ponto de de consumo e de confiança.
E a sua expectativa para economia como um todo daqui em diante?
Não só nesse momento de crise aguda – e que vai se refletir neste e no próximo trimestres –, devemos passar por um período de fragilidade econômica, com números muito baixos, por um período mais longo do que gostaríamos, e até que prevíamos originalmente.
A economia brasileira pegou essa crise em uma situação de fragilidade fiscal e, mesmo do ponto de vista de crescimento, vinha começando um processo de recuperação que ainda era muito frágil.
Então, temos agora um primeiro momento em que foram tomadas uma série de medidas fiscais, monetárias e de estímulos para tentar reduzir o impacto da crise de saúde. Mas temos à frente que enfrentar aqueles mesmos problemas que estavam presentes antes e que não haviam sido enfrentados.
Um novo conjunto de medidas precisam ser pensadas para o futuro pra que se consiga reorganizar uma economia que já vinha frágil e que, agora, sofreu um baque, que gerou aumento dos gastos que terão que, lá na frente, ser reconsiderados para que a gente não perca uma rota de solvência, de confiança, que vai ser fundamental para a retomada de crescimento.
Qual a expectativa para a recuperação?
Eu dividiria em alguns aspectos quando se pensa no que é preciso para tentar reorganizar e devolver a economia ao fluxo de crescimento. Primeiro, tem, sim, do ponto de vista social, uma preocupação muito grande. Boa parte desses auxílios e dos mecanismos que foram criados, dos programas que foram lançados, eles são importantes em alguma medida e teremos que analisar como que reorganizaremos essa nossa rede proteção social de forma sustentável.
Mas a questão fiscal não pode ser simplesmente esquecida. Temos, sim, que gastar neste momento, existem prioridades que foram colocadas à frente corretamente do ponto de vista dos gastos públicos, mas teremos que retomar essa discussão do reequilíbrio fiscal lá na frente.
E tem outra questão muito importante que é o crédito. Se nós desorganizarmos o mercado de crédito, que vinha finalmente entrando em um processo de melhoria, nós transformaremos esse motor tão importante de ajuda em um fator de aprofundamento da recessão, com inadimplência alta e endividamento excessivo da população e das empresas.
Qual vai ser o custo disso tudo para o Brasil nos próximos anos?
O principal ponto de atenção é garantir uma saída organizada para a crise. O que mais me preocupa nesse momento é não termos uma coordenação de programas que ataquem todos os pontos da crise, nem um plano para reorganização da economia no futuro.
O que precisamos é estruturar um programa de recuperação. Essa crise tem profundidade, magnitude e amplitude que exigem um programa que seja coordenado para todas essas áreas: social, fiscal e de crédito. Se não olhamos todos os aspectos, de forma organizada entre os diversos entes federativos, entre Executivo e Congresso, vai ficar muito difícil que essa retomada seja feito da forma correta para combater os problemas que estão à frente.
Como fica a economia mundial e como o Brasil está inserido nesse cenário?
Esse é justamente um problema adicional: a economia global também está sofrendo. Nós não teremos ajuda do ponto de vista de demanda e crescimento global para nos empurrar na melhor direção. Ao contrário: é um dos agravantes nesse momento.
Então, é necessário organizarmos internamente essa agenda e coordenarmos esforços em todos os níveis federativos, todos os poderes, para garantir que, internamente, nós vamos ter as ferramentas e a capacidade de retomar o crescimento da economia.

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